Regime jurídico das concessões e PPPs: o que muda com a Nova Lei de Licitações?

Davi Madalon Fraga*

A chamada Nova Lei de Licitações (Lei Federal 14.133/2021) substitui e consolida muitas das normas que regem as contratações públicas, inclusive aquelas constantes da Lei Federal 8.666/1993, da Lei do Pregão, do RDC, entre diversas outras, afetando, diretamente, o regime jurídico das contratações públicas que se deem sob o formato de um contrato administrativo tradicional.

 Contudo, sabe-se, a escassez de recursos para promoção dessa espécie de contratação, entre outros motivos de ordem pragmática, tem conduzido a Administração Pública – em especial a Federal – a optar por contratos na modalidade de concessão ou de parcerias público-privadas (“PPP”). De fato, segundo dados do Ministério da Infraestrutura, entre os anos de 2021 e 2022, estimam-se investimentos da de mais de 200 bilhões de reais em projetos nesse formato1.

Essa prevalência de modelos mais modernos de contratação enquanto substitutos daquele contrato administrativo clássico impulsiona o questionamento: especificamente quanto ao regime jurídico das concessões e das PPP, a nova lei impõe alguma alteração?

Afinal, como se sabe, essas espécies contratuais, a despeito da aplicação subsidiária da agora antiga Lei de Licitações, são dotadas de regime jurídico próprio – regidas, respectivamente, pelas Leis Federais 8.987/1995 e 11.079/2004 – e, dessa feita, estão sujeitas a regramento específico.

Muito embora não se pretenda, nestas linhas, esgotar o tema ou apresentar soluções para as situações controversas que eventualmente venham a ser indicadas, é possível apresentar algumas conclusões iniciais. Afinal, como se sabe, a aplicação da Nova Lei de Licitações ainda é embrionária, bem como seu enfrentamento pelo judiciário e órgãos de controle, de modo que ainda há muito a ser construído no campo doutrinário e jurisprudencial até que se tenham estabelecidos os impactos dessa legislação nos contratos administrativos de concessão e PPP.

De pronto, impõe-se o registro: a nova Lei de Licitações não altera diretamente o conteúdo das Leis Federais 8.987/1995 e 11.079/2004. Contudo, as concessões de direito real de uso foram objeto de regulamentação específica pela Nova Lei, na forma do art. 2º, inciso I, segundo o qual, “[e]sta Lei se aplica [à] alienação e concessão de direito real de uso de bens”. 

Para além disso, todas as modificações trazidas para os procedimentos licitatórios, também se aplicarão a todas as modalidades de concessão e PPP. A esse respeito, citem-se – apenas para exemplificar, já que não é esse o tema principal deste artigo – a possibilidade de uso da modalidade licitatória de diálogo competitivo (art. 6º, XLII, art. 28, V), um mecanismo até então estranho às contratações públicas no Brasil; a unificação da fase recursal, que agora se dá ao final da habilitação (art. 165, §1º, I); e o prazo para interposição de recursos, que foi reduzido de cinco para três dias úteis (art. 165, I).

Mas, em se tratando da aplicação subsidiária da Lei Geral aos regimes de concessão e PPP, algo muda?

Como se sabe, a antiga Lei Federal 8.666/1993 (art. 124) é expressa ao indicar sua aplicação subsidiária e supletiva a aquelas espécies  de contratação em que não houvesse conflito com a legislação específica. A nova Lei repete esse comando em seu art. 186, segundo o qual “[a]plicam-se as disposições desta Lei subsidiariamente à Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, à Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004”.

Disso se extrai que toda alteração ao regime jurídico dos contratos administrativos que não confronte as disposições da Lei de concessões e da Lei de PPP também se refletirá nessas modalidades de contratação. Algumas alterações da nova legislação podem ser destacadas.

Uma delas consiste na remuneração variável, especificamente para a fase de execução de obras do empreendimento, em que a Administração remunere diretamente o particular para tanto. Conforme art. 144 da Nova Lei, na contratação de obras, fornecimentos e serviços de engenharia poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazos de entrega definidos no edital de licitação e no contrato.

Nessa hipótese, o pagamento poderá ser ajustado em base percentual sobre o valor economizado em determinada despesa, quando o objeto do contrato visar à implantação de processo de racionalização, hipótese em que as despesas correrão à conta dos mesmos créditos orçamentários, na forma de regulamentação específica.

Outra inovação está na possibilidade de se estabelecer mais de um índice de reajustamento anual, sendo ele específico ou setorial, conforme art. 92, §3º. Esse permissivo legal é especialmente interessante aos contratos de concessão de serviços públicos precedidos de obras públicas, uma vez que, do ponto de vista de mercado em um caso específico, é razoável supor índices ou fórmulas diferentes para reajuste da tarifa paga pelo usuário ou da outorga paga pelo concessionário e dos preços para execução de obras, por exemplo.

Também se vislumbra a possibilidade de adoção subsidiária da nova Lei aos contratos de concessão e PPP que envolvam obras públicas no que diz respeito à regulamentação do reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos. A legislação atualizada traz (art. 124, §2º), como fator típico a ensejar a repactuação para recomposição da equação econômico-financeira contratual, a execução de obras que tenha sido obstada por atrasos na conclusão de procedimentos de desapropriação, desocupação, servidão administrativa ou licenciamento ambiental, por circunstâncias alheias à esfera de responsabilidade e controle do contratado.

Por fim, outro destaque positivo da nova Lei no que diz respeito aos contratos e que se aplicará igualmente àqueles de concessão, é a norma contida do parágrafo único do art. 123, que estipula prazo máximo de um mês para que a Administração responda às solicitações formuladas pelo contratado. Muito embora não haja consequência para o descumprimento desse prazo, trata-se de um primeiro passo importante na tentativa de afastar as hipóteses de silêncio administrativo às quais os particulares contratados pelo Poder Público usualmente são sujeitados.

1 Disponível em <https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/concessoes/projetos>, acesso em 12/7/2021.
*Davi Madalon Fraga é especialista em Direito do Estado pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e advogado sênior do Giamundo Neto Advogados.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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