Procurador junto ao TCU contesta “amenidade” de relatório técnico sobre desestatização da Codesa


Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O procurador junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) Júlio Marcelo de Oliveira deu parecer na última quarta-feira (1º) solicitando ao relator do processo de desestatização da Codesa (Companhia Docas do Espírito Santo) no órgão que determine ao governo uma série de medidas, entre elas a reabertura de audiência pública, antes de lançar o edital para o leilão da empresa.

O despacho do procurador faz críticas aos estudos apresentados pelo Ministério da Infraestrutura para o processo da primeira desestatização de uma autoridade portuária no país, corroborando os achados apresentados pela Secretaria de Infraestrutura do tribunal no processo de análise dos estudos.

Mas ele critica o resultado do trabalho da secretaria do TCU por ter, apesar de apontado uma série de problemas, feito um encaminhamento pela aprovação dos estudos, permitindo que correções possam ser feitas apenas nos procedimentos seguintes de desestatização portuária. O procurador indica haver uma preocupação em não “barrar” o processo.

“Talvez a amenidade da proposta de encaminhamento da equipe de auditores decorra de uma subjacente preocupação em não ‘barrar’ o processo, todavia, no entendimento do MP [Ministério Público] de Contas, o caso enseja, por parte do TCU, como instância técnica de fiscalização superior, o encaminhamento de determinações ao poder concedente para que sejam imediatamente adotadas todas as medidas necessárias para dar higidez mínima à ora pretendida desestatização de porto público, antes de qualquer sinalização que autorize os gestores a, açodadamente, publicarem o edital da almejada concessão”, escreveu o procurador.

Após receber o despacho, o relator do processo, ministro Bruno Dantas, encaminhou o documento ao Ministério da Infraestrutura e à ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) para que apresentem contestação em até cinco dias. 

Há uma expectativa do governo em ver o processo aprovado ainda neste ano. Mas o TCU só deverá fazer, no máximo, mais duas sessões plenária antes de seu recesso de fim de ano. O posicionamento contrário do Ministério Público já era esperado e, na avaliação de um dos envolvidos no processo, já teve todas as questões levantadas endereçadas anteriormente entre o ministério e o tribunal.

Inconsistências
O relatório da Secretaria de Infraestrutura do TCU, documento onde os auditores avaliam os estudos de viabilidade apresentados para a concessão, teve críticas aos procedimentos adotados pelo governo em relação ao processo da Codesa, indicando até mesmo que os números apresentados eram inconsistentes, conforme reportagem da Agência iNFRA neste link.

Parte dos problemas apontados nos estudos foram corrigidos ainda durante as análises por parte do ministério, o que levou a uma revisão em tetos tarifários e valores de outorga, por exemplo, o que foi destacado pelo procurador de forma elogiosa sobre o trabalho dos auditores.

No entanto, foram relevados pelos auditores os apontamentos que indicavam irregularidades nos procedimentos de audiência pública e transparência. O alerta foi para que, nos futuros processos do gênero que forem encaminhados ao órgão, esses procedimentos sejam realizados de forma adequada. O procurador, no entanto, teve entendimento diverso sobre o tema e indicou que essas irregularidades não podem ser corrigidas apenas para processos futuros.

“É inadmissível o encaminhamento no sentido de protelar para os próximos processos a devida correção de certos indícios de irregularidades detectadas”, escreveu Oliveira.

Falta de estudo prévio
Dois aspectos chamam a atenção nos pedidos do procurador. O primeiro trata da falta de um estudo prévio por parte do governo para justificar os motivos para fazer a desestatização das autoridades portuárias. De acordo com Oliveira, não há justificativa técnica para a decisão, com avaliação que compare as opções possíveis para a melhoria da gestão dos portos públicos e escolha do chamado modelo de land lord privado como o mais adequado.

O procurador alerta que o modelo apresentado tem semelhanças com o que foi adotado pelo governo australiano para a desestatização de seus portos, o que levou a severas críticas por parte de usuários pelos elevados aumentos de custos provocados pela desestatização.

O Ministério da Infraestrutura tem dito que não seguiu o modelo australiano de forma igual, fazendo adequações para corrigir problemas detectados naquele país. Entre as adequações, haverá uma regulação mais presente da ANTAQ. Mas uma das críticas do procurado é que a agência tem que apresentar um modelo de regulação antes de a concessão ocorrer. O outro tema tratado como grave pelo procurador foi a falta de transparência em relação aos dados dos estudos, que, para ele, não têm justificativa para ficarem em segredo até o momento.

O advogado Cássio Lourenço Ribeiro, sócio da Lourenço Ribeiro Advogados, disse que foi procurado pela ATP (Associação de Terminais Portuários Privados) e outras empresas e entidades que se mostraram preocupadas com a desestatização da Codesa. 

“Temos apontado as inconsistências do processo e do modelo, que se afasta das melhores práticas internacionais e ameaça sobreonerar a corrente de comércio, em prejuízo à geração de divisas, investimentos, emprego e renda”, disse o advogado, que defendeu a posição da procuradoria do TCU.

Outros processos
O procurador Júlio Marcelo de Oliveira ainda mostrou preocupação com outros processos que já estão qualificados para desestatização portuária, para evitar que problemas na Codesa possam influenciar negativamente eles.

“Vale reiterar: no caso em apreço há o agravante de se tratar de um processo pioneiro, que poderá ser precipitadamente referendado pelo governo como sendo um “sucesso” e, a partir disso, servir de equivocado modelo para as desestatizações de portos de maior relevo, estratégicos para o país, tais como os portos de Itajaí, São Sebastião e Santos”, afirmou Júlio.

Minfra defende que melhorias foram incorporadas
Em resposta a questionamento da Agência iNFRA sobre o parecer do Ministério Público junto ao TCU, o Ministério da Infraestrutura informou que a entrega do parecer do procurador encerra mais uma etapa do processo, permitindo que a desestatização da Codesa entre em discussão pelo plenário.

O texto destaca que ocorreram diversas reuniões entre as equipes técnicas do Ministério da Infraestrutura, da Codesa, do BNDES, da ANTAQ e do TCU desde agosto de 2021, quando o projeto foi entregue à corte de contas, para “auxiliar os técnicos do Tribunal a compreender melhor o modelo proposto e suas regras, bem como no esclarecimento de eventuais dúvidas”.

Lembrou também que a equipe do TCU realizou diligências específicas para esclarecimento da proposta e foram identificadas oportunidades de melhoria da modelagem. 

“Logo, o ganho é visível, não só em precisão como também na clareza das regras propostas que o futuro controlador da Codesa, concessionário da exploração dos Portos de Vitória/Vila Velha e Barra do Riacho, estará submetido. Essas melhorias foram gradativamente incorporadas ao modelo e apresentadas aos técnicos do tribunal conforme evolução das discussões sobre o tema”, informa o texto.

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