Novo presidente da Infra S/A defende rever projetos com problemas antes da licitação

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O novo presidente da Infra S/A, Jorge Bastos, assume com a tarefa de apoiar o governo nos estudos para a licitação de dezenas de projetos de concessão sob responsabilidade da estatal nos últimos anos.

Mas, apesar de o governo ter pressa em fazer leilões e gerar investimentos o mais rapidamente possível, Bastos defende que projetos com problemas graves sejam revistos antes do lançamento de editais.

“Se a gente vir que tem algo errado, é melhor rever”, disse em entrevista exclusiva à Agência iNFRA antes de sua posse nesta quinta-feira (2).

Pós-graduado em Gestão de Projetos pelo Ibmec, Bastos retorna ao governo depois de um ciclo que começou em 2012 na diretoria da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e se encerrou com a presidência da EPL (Empresa de Planejamento e Logística) até 2019, empresa da qual o processo de fusão, com a Valec, iniciado na gestão passada, ele terá que concluir.

Vários dos projetos que a empresa hoje tem que cuidar, como a execução da Fico (Ferrovia de Integração Centro-Oeste), começaram nas gestões anteriores dele. Ele promete que dará transparência aos processos da empresa e não descarta até mesmo que ela possa voltar a contratar a construção de ferrovias no país, o que era a expertise da Valec.

“A Valec é uma empresa que construiu milhares de quilômetros de ferrovias. Criou-se um caos que acho de certa maneira injusto com a empresa”, disse Bastos na conversa que pode ser lida abaixo.
 
Quais são os planos para consolidar a empresa, que foi criada recentemente com a fusão da Valec e da EPL?
Estou pegando a empresa ainda em fase de constituição. A primeira coisa é consolidar como Infra S/A, com os trâmites necessários para juntar as duas empresas como uma nova empresa para prestar serviços. Será a primeira ação realizada.

A segunda é fazer todo um levantamento de problemas que temos junto ao Tribunal de Contas [da União]. Avaliar todas as demandas. Tem determinações para as duas empresas que precisamos saber quais são e quais foram as respostas e atitudes das empresas em relação a essas demandas. 

O ministro dos Transportes, Renan Filho, passou para ao senhor alguma missão que ele quer que a Infra S/A desenvolva?
O ministro me deu condições de trabalhar e temos o compromisso de fazer entregas para o governo, que temos que ajudar. O ministro quer dar celeridade aos projetos. Ele quer fazer investimentos em ferrovias, agilizando isso da maneira mais rápida possível. Fazer as PPPs (parcerias público-privadas) necessárias para isso. É um pleito grande. E ver as concessões todas que estão com problemas, da 3ª Etapa e até da 2ª. Dar uma agilidade nisso. São rodovias estruturantes do país, que a carga tem que passar por elas. A celeridade é para fazer as novas licitações.

A ideia é manter o projeto de relicitação ou será necessário alterar algo na lei e ou nos decretos e portarias sobre o tema?
O ministro pediu para que a gente analise como estão os processos. Se tiver de criar regra nova, vamos estabelecer [diálogo] com a Casa Civil e os outros órgãos, e o ministro que vai tratar disso, para ajudar a que saia o mais rapidamente possível.

Nos últimos anos temos tido uma concentração de players disputando concessões federais, especialmente em rodovias. Isso é preocupação do governo?
Nossa grande concessão, a rainha, era a Dutra, a Rio-São Paulo. Concedemos ela no ano passado e tivemos dois interessados. Tem alguma coisa errada nisso. Como você tem uma estrutura como a da Dutra que só tem dois interessados? Temos que corrigir e ver onde estão as falhas para que a gente possa trazer mais gente. Não desmerecendo quem fez nem os concorrentes. A CCR é uma das grandes empresas do Brasil, talvez do mundo, em concessão de rodovias. Não é quem venceu, é o pleito. Merecia uma disputa maior. Por que os de fora não vieram? Aí a resposta foi que vieram, mas com dinheiro de investidor de fundo, na Bolsa… Precisamos de outros players, e isso não é desmerecer os nossos. Por que os que estão aqui no Brasil não entraram? Temos que rever isso, o que realmente interessa para termos mais concorrência. Não podemos cometer os mesmos erros que cometemos no passado. Temos que aprender.

E no que os estudos vão poder ajudar a ter essa ampliação de participantes?
A gente vai levar ao governo as tendências de mercado e as melhores práticas. Dividir risco com o concessionário é interessante. Fica estabelecido em princípio. Já aprendemos com as intempéries que ocorreram ao longo do tempo para que não venha a acontecer de novo. 

Uma das coisas que falam é que o Brasil faz um modelo de concessão rodoviária muito diferente do resto do mundo…
Temos uma condição de rodovia que poucos países do mundo têm. A gente ao longo do tempo optou muito pelo rodoviário e deixou o ferroviário de lado. São grandes volumes transportados na rodovia que são cargas ferroviárias. O PNL (Plano Nacional de Logística) é importante nesse sentido, para ver o que pode ser transportado por outros setores. A multimodalidade é muito pouco usada no Brasil. Temos que tratar isso de maneira forte para ver como podemos transportar melhor. Temos que olhar dutos, hidrovias… Tem que olhar o que pode ser agregado. Mas o importante é que ninguém seja dono da verdade. Temos que estar abertos a todos os setores. O ministro falou sobre isso. A safra aumenta todo ano e fica tudo igual. A BR-163 já está saturada.

Isso significa mudar projetos que já estejam adiantados?
Vamos tocar os que estão estruturados, isso é orientação do ministro. Mas vamos rever, o que for possível, o que não for atrasar. Mas não temos compromisso com o erro. Se a gente vir que tem algo errado, é melhor rever. Não é porque está pronto que vai sair como está. Se virmos que são coisas que trazem consequências drásticas para o projeto, é melhor modificar agora e não ficar aquela colcha de retalhos, que conserta aqui e remenda ali.

O ministro já apresentou uma ideia de apoiar a quem quiser fazer ferrovias privadas, que ele tá chamando PPP de Ferrovia. Como isso está se desenvolvendo?
Vou tomar pé sobre isso quando chegar. O que temos é que a Valec está fazendo um trecho da Fiol [Ferrovia de Integração Oeste-Leste]. Vamos ver o andamento disso e também como está a construção da Fico pela Vale. Vamos acompanhar tudo isso muito de perto, para que as obras saiam no menor prazo e com qualidade.

Houve na transição uma ideia de separar as duas empresas porque a parte de construção de ferrovias da Valec tinha um desalinhamento grande em relação à função da empresa de fazer projetos. Como está agora?
Temos condições de manter. A Valec é uma empresa que construiu milhares de quilômetros de ferrovias. Criou-se um caos que acho de certa maneira injusto com a empresa. A empresa Valec é uma coisa e as pessoas que passaram lá, outra. A Valec construiu a [Ferrovia] Norte-Sul. Tirando a duplicação da Vale, não tem nada do tamanho que a Valec fez. Que fique bem claro, falo de injustiça com a empresa. Não podemos compactuar com qualquer erro ou desvio. Tem que ser apurado e esclarecido. Mas o que a empresa tem condição de fazer, e vou verificar isso, é ela cumprir com transparência e higidez seus contratos para que cumpra sua função de ser a indutora das ferrovias no Brasil. Se o governo tiver capital, para poder fazer…

Inclusive com ela?
No mundo inteiro, são os governos que constróem as ferrovias. Não dá para crucificar a empresa por uma má gestão. Temos um quadro muito qualificado tanto na EPL como na Valec, que tem servidores concursados, com larga experiência em ferrovias, que hoje você não tem aí fora. Falamos de criar uma cadeira de ferrovia na universidade porque hoje não tem mais engenheiros ferroviários. Temos que aproveitar esses quadros da melhor maneira possível. 

A Infra S.A. tem a missão de solucionar o contrato com a Transnordestina. Como pretende dar andamento a esse projeto?
Vamos seguir a orientação do ministro sobre como conduzir. Estou chegando agora e não sei em que pé está isso. Vou tomar conhecimento de tudo. Esse também é um tema que vamos tratar com o TCU [Tribunal de Contas da União] para que saia da melhor maneira possível, com aval do TCU. Isso tem que estar muito claro e transparente para que a obra conclua. A Transnordestina já tem boa parte construída. A pior obra é aquela que fica sempre inacabada. A solução para essa ferrovia é superimportante. Temos que ter uma solução o mais rapidamente possível.

A EPL toca o projeto do PNL, o planejamento de longo prazo do setor de transportes e logística do país. Como o senhor pretende tratar desse tema?
Acho que talvez esse seja um dos temas mais relevantes da empresa. É fundamental para o país ter um Plano Nacional de Logística que seja discutido com toda a sociedade, os órgão de logística, governos. Tem que ser um plano que atenda às demandas do país, trabalhado com todos os setores, serviço, agricultura, agropecuária, mineral, combustível, federações, Congresso Nacional. Tem que conversar com cada um para saber a necessidade. 

Nos países desenvolvidos a gente vê isso. A Alemanha sabe o que vai fazer daqui a cinco, 15 anos. Sabe da necessidade que vai enfrentar pelo crescimento que vem tendo. É importante que todos participem para que a gente chegue a um plano de Estado, que transpasse governo e tenha continuidade. É fundamental saber, porque o país já pode começar a tratar de estudos, licenças, proteger as áreas para que não sejam ocupadas.

Isso pode dar aos governantes uma posição melhor para que não seja tão demandado a ficar gastando recursos públicos com pequenos projetos, nesse modelo de emendas?
Fundamental até para a economia do governo. Você fica tentando tapar buracos que, se tiver um planejamento de longo prazo, não vai precisar ficar remendando. Isso gera custo excessivo.

A EPL fazia estudos em outras áreas, inclusive o portuário, que não é mais do ministério, e até no saneamento. Pretende continuar?
A EPL está a princípio ligada ao Ministério dos Transportes, mas ela é de planejamento e logística. Ela é do governo, mas tem que gerar lucro. O que queremos fazer é trabalhar em todas as áreas do governo que nos demande, trabalhar com afinco para o Ministério de Portos e Aeroportos. Temos que ter um trabalho em conjunto com a EPE (Empresa de Pesquisa Energética) dentro do plano de logística. Temos algumas similaridades de serviços com ela. Vamos trabalhar para quem nos demandar, estados e prefeituras que precisarem de projetos. Temos condições de fazer. O caminho é amplo para prestar serviços e planejamento.

E como o senhor imagina que a Infra S/A vai estar no fim do ciclo?
Estou há algum tempo nesse setor e aceitei o honroso convite de um ministro que é um dos grandes nomes da política no Brasil, o Renan Filho. Foi seis anos prefeito, oito anos governador, quatro anos deputado federal, tem uma carreira fantástica. Ele me deu essa incumbência, e eu não poderia deixar de aceitar, porque eu acredito que a gente possa fazer a diferença no campo do planejamento e da logística. É fundamental que a gente tenha um planejamento para que as coisas aconteçam sem desvios. Se você tem um planejamento sério e correto, você consegue alcançar.

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