iNFRADebate: Segurança jurídica para investimento privado em infraestrutura e o que não precisa ser mudado nas leis de concessão e PPPs

Mauricio Portugal Ribeiro*¹

A segurança sobre a aplicação de qualquer lei é dada pelo conjunto de decisões administrativas, judiciais, arbitrais e da iniciativa privada acumuladas em torno dos dispositivos legais. Cada vez que mudamos leis que têm mais de 10, 20 anos, como as leis de concessão comum ou PPPs, é como se “zerássemos o jogo”. Tudo se torna inseguro. Todo processo de formação de consensos em torno dos dispositivos legais começa de novo. Por isso, mudanças legislativas em leis desse tipo devem ser pontuais, parcimoniosas, econômicas, de maneira a preservar o amplo espectro de decisões que já foram tomadas em torno dessas leis².

Isso é particularmente importante em um país que precisa gerar segurança jurídica para fazer um grande programa de investimentos em infraestrutura, e que, para isso, precisa galgar vários degraus nos rankings mundiais³ sobre o ambiente de negócios para investimentos privados em infraestrutura.

Há algumas semanas, está em curso o processo de revisão das Leis de Concessão e PPP liderado pelo Congresso Nacional, que criou uma Comissão Especial para analisar o tema, da qual é relator o Deputado Arnaldo Jardim, cujo envolvimento com os temas de infraestrutura não é novo, e que tem dado várias declarações nas últimas semanas sobre o que será e o que não será contemplado pela reforma das leis de concessão e PPP.

Na semana passada, por exemplo, o Deputado disse que incluiria nas leis os “dispute boards”, isso é comissões técnicas formadas para solução de conflitos entre as partes. No mundo das concessões e PPPs, não tem nada de novo no uso dessas comissões técnicas. Elas estão previstas em vários contratos de concessão e PPP e, quando utilizadas, têm funcionado bem. Nunca vi qualquer questionamento jurídico sobre a sua validade ou sobre o seu funcionamento. Por que, então, mudar as leis de concessões e PPPs para lidar com temas que simplesmente não precisam estar em lei?

A pergunta seria irrelevante se não houvesse pelo menos outras 14 sugestões de mudança da lei, que estão sendo debatidas como se fossem necessárias, mas que são ou completamente desnecessárias ou pioram o ambiente para realização de concessões e PPPs. Segue a lista:

  1. Regras sobre indicadores de serviço e sistema de pagamento – as leis de concessão e PPP já permitem a caracterização adequada de indicadores de serviço e sistema de pagamentos nos contratos de concessões e PPPs e isso tem sido previsto em muitos casos de maneira adequada nos contratos, quando a modelagem do contrato é feita por pessoas que entendem do tema. Mencionar isso em lei não vai mudar nada. Trata-se de tema que precisa ser tratado na modelagem de cada contrato.
  2. Regras sobre bens reversíveis – há de fato necessidade de melhorar as regras dos contratos sobre bens reversíveis, mas não há nenhuma necessidade de mudar as leis de concessão ou PPP para isso.
  3. Regra que condiciona a distribuição de riscos a ter ou não seguros – há propostas de levar à lei cláusula que se tornou comum em contratos de concessão e PPP que faz a distribuição de riscos do contrato depender de existir ou não seguro para cobertura desses riscos. Essa cláusula contratual cria insegurança sobre distribuição de riscos e deveria ser suprimida dos contratos. Note-se que a distribuição de riscos em contratos de longo prazo se faz para garantir que as partes vão tentar evitar ou minorar os impactos da ocorrência de eventos gravosos que podem perturbar o cumprimento de obrigações centrais das partes. Essas ações para prevenir riscos às vezes envolvem investimentos. Por exemplo, o concessionário que investe para reduzir o volume de consumo de energia. Às vezes ele faz esse investimento no primeiro ano, apesar da decisão de realizar esse investimento ter em vista os benefícios potenciais da redução do custo de energia ao longo de 10, 20 ou 30 anos. Se a alocação de um risco desse tipo depender de elementos futuros, é óbvio que o concessionário não vai realizar o investimento para redução do custo, pois haverá insegurança sobre se ele obterá os benefícios do investimento. Portanto, fazer depender a alocação de riscos do contrato de elementos a serem verificados no futuro é má-técnica contratual. Evidentemente, não faz sentido levar isso para a lei.
  4. Regras sobre o nível de detalhamento dos projetos para início da licitação, ou sobre a liberdade de uso de metodologias ou materiais para construção – eu não me lembro de contrato de concessão ou PPP que tenha impedido concessionário de usar metodologias ou materiais de construção à sua escolha, com vistas a aumentar a eficiência da contratação. Não há razão para levar isso para o texto legal.
  5. Regra autorizando a contratação de auditores para cálculos relativos a reequilíbrio de contratos – esse tipo de contratação já foi feita várias vezes por agências reguladoras ou outros entes ou órgãos de Estados e Municípios. Para que, então, mudar a lei se isso já é permitido e já é feito? No âmbito da União, em relação a este tema, o problema é a regra da LDO – Lei das Diretrizes Orçamentárias constante do artigo 17 da LDO de 2019, que tem sido repetida nas LDOs dos últimos anos, e interpretada como proibição para contratação de consultores para atividades que podem ser desempenhadas por funcionários públicos. A solução correta para o problema é mudar essa regra da LDO. Aliás, mesmo que se inclua regra na Lei Federal de Concessão e/ou de PPPs possibilitando a contratação de “auditores” para assessorar o poder concedente nos reequilíbrios do contrato, se a LDO continuar todo ano repetindo a regra que proíbe a contratação de consultores para realizar atividades que podem ser desempenhadas por agentes públicos, vai haver conflito normativo, e surgirão dúvidas sobre se deve prevalecer a lei específica (nesse caso, as de concessão ou PPP) ou a lei mais recente (já que a LDO é reeditada todo ano). Além disso, abre-se a discussão sobre a regularidade da contratação no passado dessas consultorias, uma vez que não havia previsão legal específica para isso. Portanto, essa mudança legal, do modo como está sendo proposta, vai gerar inseguranças sobre um tema central para o bom funcionamento do programa brasileiro de concessões e PPPs. Por fim, a utilização da palavra “auditores” na sugestão de alteração normativa não me parece seguir a melhor técnica. Trata-se de contratação de consultores para análise de pleitos de reequilíbrio ou de revisões de contratos7.
  6. Inclusão da assinatura de termo preliminar ao contrato de concessão para cumprimento de condições – isso é regrado adequadamente pelos contratos; não há razão para estabelecer regras legais também sobre esse tema. O problema que temos nessa área é que o poder público muitas vezes não consegue cumprir as condições necessárias para o início da execução do contrato, e os concessionários cedem à pressão política e iniciam a execução do contrato mesmo com cumprimento deficiente das obrigações preliminares do poder concedente. Trata-se de exercício por concessionários do seu poder de disposição, do poder de liberar o poder concedente para ou não cumprir as suas obrigações, ou cumpri-las posteriormente. Apenas para ilustrar, posso mencionar o caso da PPP da Linha 04 do Metrô de São Paulo. O concessionário liberou o poder concedente de implantar a “clearing house”, que outorgaria a garantia de pagamento público, antes do início da operação. Também no caso da PPP de escolas de Belo Horizonte, o concessionário transigiu para que a garantia fosse implantada em cronograma e em condições diferentes daquelas originalmente previstas. E por fim, talvez o caso mais emblemático seja o do Aeroporto de Viracopos, no qual o concessionário aceitou mudar o local de implantação do terminal de passageiros para manter o seu prazo de construção, porque o poder concedente não conseguiu desapropriar a área do sítio aeroportuário na qual o concessionário pretendia na origem construir o terminal. Enfim, em todos esses casos, se trata de transigência do concessionário que aceitou começar a execução do contrato sem o cumprimento das obrigações do poder concedente. Em nenhum desses casos, e em nenhum dos outros casos do gênero o termo preliminar que estão propondo incluir na lei vai resolver o problema. Se houvesse o termo preliminar, o concessionário poderia do mesmo jeito resolver dispensar o poder concedente de cumprir as condições precedentes para emissão da ordem de serviço. Qual o sentido de levar esse tema para a lei?
  7. Condicionar intervenção e caducidade a decisão de comitê técnico – em primeiro lugar, é preciso destacar que estamos falando talvez das duas decisões mais graves que um poder concedente pode tomar em relação a um concessionário. E essas decisões têm um componente de descumprimento do contrato pelo concessionário e têm também um componente político, de entendimento pelo poder público da necessidade de obter o controle da concessão ou de terminar o contrato de concessão. A verificação da ocorrência dos descumprimentos alegados tanto como base para a intervenção quanto como fundamento para a caducidade e, também, a verificação da responsabilidade pelos alegados descumprimentos pode ser aferido por uma comissão técnica8. Mas a valoração sobre se o descumprimento é grave o suficiente para caminhar para a intervenção ou caducidade, não me parece algo que possa ser resolvido por membros de comissão técnica, nem mesmo por árbitros. Essa decisão deveria ser prerrogativa do poder público. O que me parece que pode sim ser submetido à arbitragem é a verificação da ocorrência dos descumprimentos alegados do contrato e a verificação da adequação do procedimento seguido pelo poder concedente ou agência reguladora para adoção das decisões sobre caducidade ou intervenção. Parece-me muito estranho, contudo, submeter esse tipo de julgamento a uma comissão técnica. E se a decisão da comissão técnica for depois entendida em juízo arbitral ou judicial como equivocada, ela responderá por isso? Com que patrimônio? Só haveria o patrimônio pessoal dos membros da comissão, que, por óbvio, não faz sentido ser alcançado nesse caso. Portanto, se trata de decisões tão graves e com aspecto político relevante, que me parece pouco adequado imaginar que membros de comissão técnica se envolvam nisso. Novamente, não me parece fazer sentido a inclusão de dispositivo desse tipo em lei. O que faria sentido seria incluir disposição permitindo que a decisão sobre a caducidade do contrato, sobre a sua rescisão ou sobre qualquer outra forma de extinção antecipada do contrato seja submetida à arbitragem. Note-se que essas decisões atualmente sequer podem ser submetidas à arbitragem. Nesse contexto, me parece precoce e sem sentido imaginar comissões técnicas decidindo sobre esses temas.
  8. Incluir regras autorizando distribuição de risco cambial e de demanda em concessões comuns ou PPPs – a lei de PPP prevê expressamente a possibilidade de o contrato distribuir riscos (art. 5°, inciso III). E a lei de concessões, por ser mais antiga, não tem nenhuma disposição específica nesse sentido, mas todos os contratos de concessão do país têm implícita ou explicitamente regras sobre distribuição de vários riscos. E nunca vi questionamentos sobre a regularidade disso. Em relação ao risco cambial, já se se fez distribuição do risco cambial em vários contratos, sem que fosse necessário a previsão disso em lei. Veja como exemplo o contrato de PPP da linha 04 do Metrô de São Paulo, que é de 2006, ou os recentes contratos de concessão comum de aeroportos federais, ou ainda os recentes contratos de concessão comum de rodovias do Estado de São Paulo. Portanto, não é necessário incluir em lei regra autorizando a distribuição de riscos cambiais. Aliás, incluir regra desse tipo pode ter por efeito gerar enorme de insegurança jurídica, porque imagine que se tornarão possíveis raciocínios como o seguinte: “a lei autorizou expressamente a distribuição de riscos cambiais, mas não autorizou expressamente a distribuição de outros riscos; portanto não é viável a distribuição de outros riscos que não o cambial”. Enfim, esse dispositivo pode colocar em dúvida a regularidade de se distribuir todos os outros riscos que já são distribuídos normalmente em contratos de concessão e PPP. Além disso, cria insegurança em relação à regularidade dos contratos que já distribuíram risco cambial no passado. Poder-se-ia, em relação a eles fazer o seguinte raciocínio: “a reforma da Lei de Concessões e PPPs permitiu a distribuição de riscos cambiais; antes da reforma essa distribuição não era lícita, porque não estava prevista em lei”. Claramente, portanto, não faz o menor sentido levar esse tema para as Leis de Concessão e PPP.
  9. Prever matriz de riscos em concessão comum – essa mudança me parece desnecessária. Eu não conheço nenhum contrato de concessão celebrado nos últimos anos que não preveja regras de distribuição de riscos e não me parece haver qualquer questionamento sobre a regularidade disso. Qual a necessidade de levar isso para a lei?
  10. Regras sobre disponibilização dos estudos que embasaram os contratos – com exceção talvez do Estado de Pernambuco, que algumas vezes no passado não pôs a público todos os estudos de viabilidade de concessões, até onde sei, todos os entes públicos têm posto a público os estudos que são base para a realização de concessões e PPPs. Atualmente me parece ser consenso a necessidade de publicar esses estudos. Nesse contexto, qual o sentido de levar isso para a lei?
  11. Previsão de uso de garantias de pagamento público previsto na Lei de PPPs para concessões comuns – é preciso dizer que essa sugestão de mudança só pode ter sido feita em contexto de completo desentendimento das premissas que norteiam as regras sobre PPPs e concessões e sobre o histórico recente do país de descumprimento de regras de responsabilidade fiscal, que foram base inclusive para impeachment presidencial. A Lei de PPP, que permite pagamentos públicos em contratos de concessão, prevê como consequência uma série de regras para análise da compatibilidade dos compromissos de pagamento a serem assumidos pelo ente público com a sua capacidade de pagamento. Essas regras precisam ser cumpridas como condição para publicação do edital de licitação de uma PPP. A Lei de Concessões, por sua vez, trata de concessões que não envolvem pagamentos públicos, e, por essa razão, dispensa a análise da compatibilidade da concessão com as regras fiscais. Considerando isso, propor que os pagamentos e garantias de pagamentos previstos na Lei de PPP possam ser usados para concessões comuns é simplesmente não entender a lógica das nossas regras sobre concessões e PPPs. Notem que o Governo Dilma, no desenho das concessões de rodovias da 3ª Etapa federal – que são na prática, PPPs disfarçadas de concessão comum – fugiu das análises fiscais da Lei de PPP e criou um pagamento público disfarçado realizado por meio de subsídio ao financiamento disponibilizado pelo BNDES. Isso faz parte da nossa história recente. A sugestão de permitir pagamento e garantias de pagamento público em concessões comuns formaliza e torna lícito o vezo maroto de se fugir à análise das consequências fiscais da assunção, por meio de PPPs, de compromissos de pagamento de longo prazo. Por tudo isso, essa sugestão de alteração da lei não deveria ser desconsiderada.
  12. Inclusão em lei de procedimento para indenização por investimentos não amortizados – essa proposta também me parece bastante equivocada. Em primeiro lugar, o tema está longe de ter maturidade para figurar em mudança legislativa. No presente momento, há amplo debate na via administrativa, arbitral e judicial sobre o valor de indenizações por investimentos não amortizados e não depreciados em contratos de concessão e PPP nos quais deve ocorrer extinção antecipada. Mesmo especialistas que opinaram publicamente sobre o tema me parecem ainda ter dúvidas sobre o tema, ou mesmo tropeçar no conjunto de conhecimentos econômicos, financeiros, jurídicos e de engenharia que são necessários para a sua compreensão. Levar para lei um tema com esse ambiente me parece desaconselhável. O tema será amadurecido ao longo dos próximos anos e, com mais consensos sobre ele, podemos pensar se faz sentido criar disposições legais que tratem disso.
  13. Permitir que bens reversíveis sejam dados em garantia – eu acho essa proposta temerária. Bens reversíveis deveriam ser apenas os necessários à continuidade da operação da concessão. Permitir que eles sejam dados em garantia significa que, em uma situação de extinção antecipada do contrato, os interesses do financiador passam na frente do interesse público de continuidade do serviço. Não me parece razoável. Além disso, o financiamento deveria ser garantido prioritariamente com os direitos emergentes da concessão. E isso já acontece na prática.
  14. Desburocratização fiscal: esclarecer que PPP não configura operação de crédito ou dívida consolidada – eu acho que essa proposta não faz sentido. A discussão técnica existente sobre o assunto mostra que pagamentos públicos em PPP podem sim ter característica de operação de crédito e, por isso, devem ser considerados nesses casos para efeito de apuração da dívida. Colocar na lei que esses pagamentos não configuram operação de crédito ou dívida criaria uma ficção legal sobre operações que impactam sim o endividamento. Isso também me parece incoerente com a situação fiscal atual do país, que foi produto do tratamento lasso no passado recente de regras fiscais sobre a assunção de compromissos permanentes, como os compromissos de pagamento de despesas de pessoal.

Tenho certeza que muitas outras sugestões de mudanças legais desnecessárias ou inadequadas foram encaminhadas ao Congresso Nacional. Tive acesso as acima comentadas porque foram tornadas públicas por aqueles que as propuseram.

Há algumas pouquíssimas mudanças pontuais que precisam de fato ser feitas na Lei de PPP e concessão. Mas já adianto que podemos viver sem elas. É perfeitamente viável a estruturação e licitação de contratos com eficiência sem essas mudanças. Já levei ao conhecimento dos técnicos e assessores da Câmara dos Deputados e já expus em público algumas vezes a agenda que acho adequada. Há também sugestões interessantes que foram realizadas por diferentes agentes desse debate, mas que precisam ser mais debatidas. Entre outras, a ideia das concessões simplificadas ou a ideia de disciplinar em lei a forma de contratação de verificadores independentes. Mas, isso é tema para um outro artigo, que pretendo publicar em breve.

Há mais de 20 anos trabalhando só com concessões, PPPs e outras desestatizações, e tendo participado da elaboração de algumas mudanças legislativas, eu sei mais do que ninguém que há muitos incentivos para especialistas ou políticos mudarem leis, particularmente para imprimirem a sua marca. Quem não quer ser conhecido como aquele que viabilizou o programa de investimentos que pode, junto com outras medidas, elevar o país a um novo patamar de desenvolvimento?

Mas, como dizem lá na minha terra, “caldo de galinha e prudência não fazem mal a ninguém”. É preciso pelo menos conhecimento prático da realidade da elaboração e execução desses contratos, muita parcimônia e economia para que a mudança legal não seja mais um motivo – entre tantos outros – de novas inseguranças no nosso ambiente de negócios.

¹Eu queria agradecer a Egon Bookman Moreira e a Eduardo Jordão por terem lido e comentado versões anteriores do presente artigo. A pertinência e profundidade dos comentários que fizeram enriqueceram enormemente este artigo. A elaboração deste artigo também se beneficiou da minha participação em debate sobre esse tema com Fernando Vernalha Guimarães, Carlos Nascimento e João Negrini Neto promovido em 18/10/2019 pelo MBA PPPs e Concessões. Agradeço a Carlos o convite para o mencionado evento e a Fernando o debate de ideias. Os erros e omissões do presente artigo são evidentemente de minha responsabilidade.
2Há, contudo, alguns que defendem que a inclusão na lei de determinadas pautas pode ter efeito didático, isso é pode contribuir para mudar práticas em torno do tema tratado na lei. No presente caso, contudo, trata-se de leis que, em ampla medida, são destinadas a comunidade de especialistas. Estruturar, licitar, regular e fiscalizar concessões e PPPs são atividades hoje de pessoas especializadas no tema. A disseminação dos saberes sobre isso tem sido feita em cursos estruturados como o MBA PPPs e Concessões, o CP3P e outros. Daí que me parece que o efeito didático de mudança da lei nessa comunidade é limitado, quando comparado com situações em que a relação entre lei e prática não é mediada por comunidade de especialistas. Isso porque já há reflexão consolidada, que é disseminada de maneira estruturada, sobre como devem ser estruturados, licitados, regulados e fiscalizados os contratos de concessão e PPP, independentemente de qualquer mudança legislativa.
Por outro lado, ao realizar mudanças na lei para incorporar práticas já utilizadas, há sempre o risco de se considerar que essas práticas não eram permitidas antes da previsão legislativa, caso em que contratos que as usaram antes da previsão legal ficariam vulneráveis. Há também o risco da previsão na lei de algumas práticas já usuais reforçar o entendimento de que outras práticas, que não foram levadas à lei, não são permitidas porque não há previsão legal específica sobre elas. Esse risco me parece relevante e iminente. Essas são razões adicionais às tratadas no corpo do texto que reforçam a necessidade de parcimônia em relação a mudanças das leis de concessão e PPP
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3O Brasil está na posição 71 de 140 países, no “Global Competitiveness Report”, Fórum Econômico Mundial, de 2018, e na posição 109 entre 190 países do Doing Business 2019, do Banco Mundial.
4Felizmente, a nossa legislação evoluiu recentemente na direção da proteção da segurança jurídica por meio de normas que regulam inclusive o impacto da mudança normativa ou de entendimentos a respeito da aplicação das normas vigentes. São exemplos disso o artigo 926 do Código de Processo Civil e 30 da LINDB – Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, que tratam da atuação de agentes públicos para aumentar a segurança jurídica na interpretação e aplicação normativa. Essa atuação na direção da segurança é tanto mais efetiva quanto maior for a estabilidade das normas legais a serem interpretadas e aplicadas.
5Mudei de posição em relação a esse tema. Eu defendia no passado cláusula com essa estrutura. Vide capítulo do livro “Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos”, disponível no seguinte endereço eletrônico: http://www.portugalribeiro.com.br/ebooks/concessoes-e-ppps/as-melhores-praticas-para-modelagem-de-contratos-de-concessoes-e-ppps-alinhando-os-incentivos-para-a-prestacao-adequada-e-eficiente-dos-servicos/distribuicao-de-riscos-e-equilibrio-economico-financeiro/. Na época, eu não tinha clareza que essa incerteza quanto à alocação contratual do risco podia influenciar a decisão de investimento em prevenção de eventos gravosos ou redução dos seus impactos.
6Art. 17. §2º A contratação de serviços de consultoria, inclusive aquela realizada no âmbito de acordos de cooperação técnica com organismos e entidades internacionais, somente será autorizada para execução de atividades que, comprovadamente, não possam ser desempenhadas por servidores ou empregados da administração pública federal, no âmbito do órgão ou da entidade, publicando-se, no Diário Oficial da União, além do extrato do contrato, a justificativa e a autorização da contratação, da qual constarão, necessariamente, a identificação do responsável pela execução do contrato, descrição completa do objeto do contrato, o quantitativo médio de consultores, custo total e a especificação dos serviços e o prazo de conclusão.”
7Como me disse Egon Bookman muito propriamente “Auditores auditam; consultores fazem”. É preciso que o consultor ou o agente público façam os cálculos necessários ao reequilíbrio do contrato para que alguém posteriormente os auditem. No caso, a proposta normativa comentada, que consta de documento divulgado pela CBIC – Câmara Brasileira da Indústria da Construção, usa equivocadamente a palavra “auditores”, pois claramente está se referindo à contratação de consultores para calcular o desequilíbrio e auxiliar o ente público na realização do reequilíbrio.
8Várias vezes concessionários descumprem obrigações em situações em que esses descumprimentos se fazem por eventos que não estão sob o seu controle, ou mesmo por consequência de descumprimentos do contrato pelo poder público.
*Mauricio Portugal Ribeiro é especialista na estruturação e regulação de projetos de infraestrutura, autor de vários livros e artigos sobre esse tema, sócio do Portugal Ribeiro Advogados, mestre em Direito pela Harvard Law School, ex-professor de Direito de Infraestrutura da FGV-RJ. Foi e é advogado de diversos grupos econômicos nos setores de infraestrutura.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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