iNFRADebate: Não ao esvaziamento das agências reguladoras

As agências reguladoras são como “bolsões de eficiência”, necessários para a implementação de políticas públicas. São a garantia de que não haverá quebra de contrato por parte dos governos futuros.

O surgimento das agências reguladoras no Brasil está intimamente ligado ao processo de reforma do Estado, implementado a partir de 1990. Diante do esgotamento da capacidade de financiamento estatal, o poder público precisou fiscalizar as atividades concedidas, garantindo que a atuação do concessionário visasse sempre o interesse da coletividade. Esse novo modelo impôs a criação de um órgão regulador.

Entretanto, considerando que a interação entre a política e a burocracia pudesse gerar efeitos negativos, foram criadas características que distanciassem esses órgãos do processo eleitoral. É o conceito do “insulamento burocrático”, mecanismo que blinda a instância técnica da conjuntura política. Na verdade, esse compromisso regulatório foi a garantia exigida pelos investidores, inclusive estrangeiros, contra a expropriação e a ruptura dos contratos.

Assim foram criadas as agências reguladoras, para as quais a lei assegurou independência política dos dirigentes, que são nomeados por indicação do chefe do Poder Executivo, após aprovação do Poder Legislativo. Assegurou ainda independência deliberativa, com a impossibilidade de revisão de suas decisões pelos ministérios, e mesmo pelo presidente da República; além da independência normativa, necessária à disciplina das atividades econômicas submetidas ao seu controle. Esse modelo cumpriu o papel de gerar a confiabilidade necessária para atrair investimentos — a telefonia é um bom exemplo.

Com o passar dos anos, e não obstante sua importância no processo de melhoria da qualidade dos serviços, uma reação ao elevado grau de independência das agências se consolidou — um desconforto da sua não sujeição aos mecanismos tradicionais de accoulltability eleitoral. E foram várias as tentativas de reduzir a sua capacidade de atuação. A agilidade, a desburocratização e a especialização, características tão valorizadas pelos setores de infraestrutura, estavam constantemente ameaçadas.

Mais uma investida ocorre agora, na discussão da Medida Provisória 1.154/2023, com a Emenda 54, apresentada sob o argumento de que há casos de decisões tomadas monocraticamente por diretores que contrariam a legislação em vigor. Estranho falar em decisões ilegais, visto que, apesar de gozarem de um acentuado grau de autonomia, as agências não tem o condão de subverter a clássica hierarquia existente entre atos legislativos e atos administrativos — todo e qualquer ato emanado de entidades da Administração Pública está sujeito ao princípio da legalidade.

Além disso, há instrumentos que sustam atos do Poder Executivo que exorbitam o poder de regulamentar, como os PDLs (Projetos de Decretos Legislativos) e as ações judiciais. Não há o porquê de propor a alteração de todo um marco legal para criar ferramentas que já existem.

O autor defende ainda a criação de uma instância superior, um conselho, para fiscalizar a atuação das agências, nos moldes do que é feito no Poder Judiciário como o CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Esclarecendo, contudo, que “esse órgão não terá o papel de regulação, nem de revisão”. Qual seria, então, esse papel? Entendo que a AIR (Análise de Impacto Regulatório) é uma maneira de supervisionar a política regulatória, que tem de ser técnica e respaldada em atender aos requisitos existentes.

Na prática, esses conselhos inibirão e cercearão a atuação das agências, abrindo espaço para o esvaziamento de sua autonomia. Criará instabilidade jurídica e reforçará o apetite pelo seu controle político.

Se aprovada a emenda, corremos o risco de desorganizar por completo o atual modelo de regulamentação. Transferir aos ministérios a decisão sobre metodologias de reajuste e revisões de tarifas tende a reduzir e onerar os investimentos, inviabilizar novos projetos, e, consequentemente, reduzir os postos de trabalho.

Se há questionamento sobre atuação dessas autarquias, entendo que o caminho é promover uma modernização das regras, tais como explicitar a divisão de atribuições entre agências e ministérios, aprimorar os mecanismos de prestação de contas para a sociedade ou ainda descentralizar as atividades fiscalizadoras para as agências reguladoras estaduais. Antes de colocar em risco um modelo que tantos benefícios trouxe para economia brasileira, devemos concentrar esforços no seu aperfeiçoamento.

*Arnaldo Jardim é deputado federal pelo Cidadania (SP) e Presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

Tags:

Compartilhe essa Notícia
Facebook
Twitter
LinkedIn

Inscreva-se para receber o boletim semanal gratuito!

Assine nosso Boletim diário gratuito

e receba as informações mais importantes sobre infraestrutura no Brasil

Cancele a qualquer momento!

Solicite sua demonstração do produto Boletins e Alertas

Solicite sua demonstração do produto Fornecimento de Conteúdo

Solicite sua demonstração do produto Publicidade e Branded Content

Solicite sua demonstração do produto Realização e Cobertura de Eventos