iNFRADebate: Impactos da crescente demanda pelo engajamento empresarial contra as mudanças climáticas

Antonio Augusto Reis*, Tábata Boccanera Guerra de Oliveira e Gabriela Trovões Cabral**

Desde a década de 1970, a comunidade internacional vem formalmente reconhecendo a importância da cooperação e da discussão a respeito das questões ambientais, destacando-se a realização à época de eventos emblemáticas centrados no tema, a exemplo da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972, e da Primeira Conferência Mundial sobre o Clima, realizada em Genebra, em 1979.  

A partir de então, os temas das mudanças climáticas e da transição energética ganharam cada vez mais relevância e protagonismo na agenda internacional. Em 1992, formalizou-se a necessidade de pautar o desenvolvimento das nações de maneira sustentável na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (conhecida como Eco-92 ou Rio-92). 

A Agenda 21, acordo estabelecido entre os países durante a Rio-92, já previa dentre seus objetivos a redução dos efeitos adversos do setor de energia sobre a atmosfera, sobretudo em um contexto de grande aumento populacional e o consequente crescimento do consumo energético.

Os compromissos relacionados aos assuntos foram sendo constantemente renovados e ampliados por meio dos instrumentos existentes no sistema das Nações Unidas em matéria de direito internacional, como o Protocolo de Kyoto, que entrou em vigor em 2005 e previa obrigações de redução de emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) apenas para os países desenvolvidos, e o Acordo de Paris, firmado em 2015, que estabelece que todos os países possuem metas de redução de emissão de GEE por eles definidas.

Para além de uma pauta discutida entre as nações, a realização de uma transição energética, que migre de um modelo majoritariamente dependente de combustíveis fósseis para uma matriz energética mais focada no uso de energias renováveis como forma de combate às mudanças climáticas, vem se tornando alvo de interesse crescente da sociedade.

Tal interesse reflete na alteração do padrão de consumo por parte da sociedade civil, na cobrança de investidores por políticas empresariais efetivas para uma economia de baixo carbono e no crescimento de casos de litigância climática.

Exemplos claros desses movimentos são as Cartas de 2020 e 2021 de Larry Fink, CEO da BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, e a recente decisão do Tribunal Distrital de Haia. Referidas cartas firmaram uma tendência ao estabelecer a sustentabilidade como um dos critérios essenciais para tomada de decisão de investimento. Enquanto a Carta de 2020 apontou as mudanças climáticas como fatores decisivos para a viabilidade da atividade econômica a longo prazo, a Carta de 2021, por sua vez, propôs um aprofundamento dos compromissos relacionados às mudanças climáticas por meio da fixação de metas rigorosas que possam ser acompanhadas por investidores e stakeholders com o objetivo de alcançar uma economia de baixo carbono.  

A litigância climática, por sua vez, vem sendo adotada como um mecanismo que visa, por meio de ações judiciais, responsabilizar governos e empresas pelas mudanças climáticas ou fazer com que esses agentes sejam obrigados a implementar e efetivar direitos relacionados ao tema. Nesse âmbito, o Tribunal Distrital de Haia, ao julgar ação proposta por organizações da sociedade civil de defesa do meio ambiente e dos direitos humanos, determinou que a Royal Dutch Shell reduza suas emissões líquidas de carbono em 45% até 2030 em relação aos níveis de 2019, por entender que as políticas propostas pela companhia não são suficientes para prevenir consequências mais sérias decorrentes das mudanças climáticas e seus efeitos deletérios para a sociedade.

A decisão destacou aspectos relacionados às políticas ambientais e à governança, bem como os impactos de sua atuação para a população como fatores relevantes para ter considerado insuficientes as medidas pretendidas pela companhia, demonstrando que as questões climáticas também devem ser interpretadas a partir de critérios Environmental, Social and Governance (ESG). 

É evidente que o cenário atual demanda planejamento por parte das empresas, principalmente daquelas responsáveis por grandes emissões de GEE – a exemplo das inseridas no setor de óleo e gás – para que possam adotar programas e planos factíveis, mas ao mesmo tempo ambiciosos diante da urgência da transição energética e do enfrentamento às mudanças climáticas.

Espera-se que o tema seja integrado ao planejamento estratégico para que reflita nas metas prioritárias das corporações, no desenvolvimento de suas atividades e na interação com sua cadeia de valor, sob uma perspectiva multifacetada que enderece os aspectos ambientais, sociais e de governança relativos ao assunto.

Além disso, é de extrema relevância que os compromissos relacionados às mudanças climáticas adotem metodologia e critérios claros, a fim de garantir que as companhias possam realizar a divulgação transparente e adequada das medidas efetivamente adotadas, como tem sido demandado dos investidores e da sociedade em geral.

Nesse sentido, a adoção dos critérios ESG pode ser vista como oportunidade para auxiliar na identificação, gestão e mitigação adequada dos riscos inerentes à atividade, de forma interseccional e adequada à realidade corporativa, à forma como é desempenhado seu negócio e aos locais e comunidades com as quais atua. Se bem adotada internamente, essa integração mitigará os riscos de imposições externas e garantirá maior resiliência para o negócio enquanto são promovidas as adaptações necessárias.

*Antonio Augusto Reis é sócio do escritório de advocacia Mattos Filho.
**Tábata Boccanera Guerra de Oliveira e Gabriela Trovões Cabral são advogadas no escritório Mattos Filho.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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