iNFRADebate: Concessão rodoviária Lote Noroeste – novos avanços regulatórios e inovações tecnológicas

Edgard Benozatti*, Izabel Dompieri**, Gabriel Rosa*** e Marina Zago****

Após quase três décadas da etapa inaugural de seu Programa de Concessões Rodoviárias, o estado de São Paulo conta com uma carteira de projetos consolidada e reconhecida nacional e internacionalmente.

A publicação do edital para a licitação do Lote Noroeste, estruturado em conjunto pela Subsecretaria de Parcerias e Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo), dá início à 5ª Rodada do programa de concessões rodoviárias do estado de São Paulo. Ele tem como objeto a delegação unificada de dois lotes rodoviários distintos e importantes para o desenvolvimento logístico paulista, e que se encontram em vias de reversão ao Poder Concedente. Totalizam, conjuntamente, 600 km, e são atualmente administrados por duas diferentes concessionárias.

Iniciar a estruturação de um projeto de concessão rodoviária brownfield, em um ambiente regulatório consolidado, visando à oferta conjunta de dois ativos cuja demanda é conhecida, constitui um trunfo para qualquer equipe técnica. Ainda mais quando tais ativos possibilitam, de partida, o auferimento de receitas tarifárias pela futura operadora. 

No entanto, considerando a conjuntura atual, as etapas de modelagem do Lote Noroeste conviveram com desafios de ordem econômica, regulatória e tecnológica. O processo de identificação dos obstáculos, levantamento de alternativas e escolhas foi desafiador, porém culminou na entrega de um projeto de alto potencial, com um olhar realista e preparado para o futuro. Mais do que isso, resultou em um projeto capaz de trazer benefícios significativos para os usuários, com melhorias na qualidade da infraestrutura, maior fluidez e segurança de um lado, e redução tarifária doutro.

Cenário macroeconômico e investimentos iniciais
O cenário macroeconômico, fatores internacionais, como a alta de juros e do custo de insumos em decorrência da pandemia e da guerra na Ucrânia, vêm desafiando a estruturação de novos projetos no país (e no mundo). 

No caso do Lote Noroeste, houve, ainda, a preocupação adicional acerca dos investimentos iniciais elevados que estavam sendo propostos, na ordem de R$ 5 bilhões, para os sete primeiros anos de vigência contratual. Reconhece-se que as obrigações contratuais estabelecidas demandam fôlego financeiro da futura concessionária. 

Para contornar tais obstáculos, a modelagem econômico-financeira do Lote Noroeste adotou como data-base de orçamentação o mês de março/2022, muito próximo ao da publicação do edital, e período no qual foi possível capturar os reflexos da alta dos insumos e da inflação. Desse modo, os estudos sinalizam ao investidor, de maneira fidedigna, a viabilidade do projeto e a confiabilidade dos parâmetros objetivos iniciais do contrato.

Inovação tecnológica e justiça tarifária: sistema automático livre 
A estruturação do Lote Noroeste ocorreu durante a consolidação de alterações tecnológicas do setor rodoviário. Atento a esses avanços, o projeto inovou e é o primeiro do Brasil que contará com a conversão integral de praças de pedágio do tipo “barreira” para a estrutura de pórticos, que possibilitará a identificação do usuário e a cobrança de tarifas de pedágio por meio eletrônico.

Nessa sistemática, intitulada de sistema automático livre, os pórticos (localizados nos mesmos pontos das atuais praças de pedágio) realizarão a leitura dos dispositivos de AVI (Automatic Vehicle Identifier) dos veículos dos usuários (os chamados “tags”), permitindo a sua identificação e cobrança. A concessionária também deverá disponibilizar plataforma eletrônica para o pagamento de tarifa pelos usuários que não possuem AVI. A tarifa permanecerá sendo calculada sobre a sistemática de TCP (Trecho de Cobertura de Pedágio).

A nova tecnologia garante maior fluidez do tráfego, segurança e conforto ao usuário, reduzindo os altos índices de acidentes verificados na aproximação das praças de pedágio tradicionais.

Considerando os níveis de investimento exigidos pelo projeto e o contexto experimental da tecnologia, o contrato de concessão estabelece um cronograma de implementação faseado a ser observado pela concessionária. Há, ainda, regras de alocação de riscos específicas para os trechos já convertidos em sistema automático. 

O contrato prevê, ainda, uma estrutura de contas que endereça possíveis desequilíbrios e garante a inadimplência em caso de evasão no sistema livre. Os recursos que formam a estrutura vêm do próprio projeto (por meio da outorga variável e das multas de evasão), afastando o risco fiscal do Estado. 

Para o usuário, além das obras de ampliação de capacidade, as diversas intervenções e inovações tecnológicas previstas, o projeto do Lote Noroeste também busca garantir a justiça tarifária. As tarifas do projeto sofreram uma redução inicial de 10% em face dos valores atualmente praticados nos trechos em fim de operação delegada. Além disso, os usuários de AVI gozarão de 5% de abatimento no valor da tarifa por possuir o equipamento. Levando, ainda, em consideração o Desconto de Usuário Frequente instituído nos últimos projetos paulistas, a tarifa pode ser reduzida em até 87%.

Consolidação de avanços regulatórios
O projeto também enfrentou o desafio de consolidar e aprimorar os avanços regulatórios e de técnicas concessórias incorporados ao programa nos últimos projetos, como indicadores de desempenho, procedimentos de revisão e remarcação de parâmetros contratuais, e reequilíbrios. 

Um ponto que merece destaque é a busca pela redução do fardo regulatório, consistente na demora de aprovações que impactavam os cronogramas dos projetos e postergavam a conclusão de pleitos de alterações e reequilíbrios. O adequado estabelecimento de prazos (para todas as partes envolvidas), com a previsão de consequências contratuais claras para tais eventos buscam conferir previsibilidade às condutas dos agentes envolvidos na etapa de implementação do projeto. Ponto de destaque é a maior procedimentalização das revisões ordinárias – etapa que busca, justamente, limpar os passivos regulatórios acumulados no período fixado, sem prejuízo do acionamento de revisões extraordinárias –, com prazos para a finalização de cada ciclo e para a celebração do termo aditivo.

O Lote Noroeste foi construído em cima de uma base regulatória sólida e de histórico de sucesso. Ele traz em sua origem o DNA de estruturação de projetos do programa de concessões do estado de São Paulo, onde a busca por inovações tem por mote a obtenção do maior benefício possível a população, concomitantemente ao objeto de estruturar projetos financeiramente atraentes para players nacionais e internacionais. 

Esperamos que, com o Lote Noroeste, inauguremos mais uma etapa de sucesso do maior programa de concessões rodoviárias do Brasil.

*Edgard Benozatti é assessor econômico da Subsecretaria de Parcerias do Estado de São Paulo e mestre em Desenvolvimento Internacional e Políticas Públicas pela Universidade de Manchester.
**Izabel Dompieri de Assis é assessora da Subsecretaria de Parcerias do Estado de São Paulo, LLM na Queen Mary University of London e pós-graduada em Direito Administrativo pela FGV-SP.
***Gabriel Rosa Gracindo é assessor da Subsecretaria de Parcerias do Estado de São Paulo, mestre em Direito e Desenvolvimento e pós-graduado em Direito Administrativo pela FGV Direito SP.
****Marina Zago é coordenadora de Estruturação de Projetos da Subsecretaria de Parcerias do Estado de São Paulo, doutora em Direito do Estado pela USP, mestra em Gestão e Políticas Públicas pela EAESP/FGV e professora de Direito Administrativo no Mackenzie.
O iNFRADebate é o espaço de artigos da Agência iNFRA com opiniões de seus atores que não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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