Imbróglio jurídico sobre locação de imóveis em aeroportos pode reduzir receita de concessionárias

Dimmi Amora, para a Agência iNFRA

Um imbróglio jurídico que tramita pela Justiça da Bahia virou motivo de atenção pelo governo em relação ao sistema de concessões de bens públicos, especialmente os que têm receitas com aluguel de áreas comerciais.

A concessionária do Aeroporto de Salvador (BA), administrada pela Vinci, tentou – após o vencimento do prazo contratual – retomar a área de um posto de combustível que foi alugado pela Infraero para oferecer novamente ao mercado.

Mas a locatária da área – a empresa 3L Combustíveis – entrou na Justiça local alegando o direito de permanecer na área sob um argumento até então inédito para o sistema de concessões. Para a empresa, a lei que deve reger a relação entre os concessionários de bens públicos e os locatários é a Lei do Inquilinato e não as leis específicas que tratam de cessão de bens por órgãos públicos.

Para o advogado Maurício Portugal Ribeiro, sócio da Portugal Ribeiro Advogados, a consequência de uma decisão favorável mudando o entendimento sobre esse ponto será danosa para o sistema de concessões.

“O valor das concessões de aeroportos depende sobretudo da capacidade de a concessionária explorar as receitas imobiliárias e comerciais relacionadas ao aeroporto”, diz Ribeiro. “Se o Judiciário decidir contra a concessionária, além de criar uma enorme insegurança jurídica, impactará o valor de todos os aeroportos do país para baixo com perdas para a Infraero e para os usuários. Os aeroportos já concedidos podem até apresentar pleitos de reequilíbrio.”

Tese inovadora
O contrato de aluguel da área foi assinado entre a Infraero e a Shell há quase duas décadas. Posteriormente, após mudanças na legislação, a Raízen, nova empresa que controla a marca Shell no Brasil, sublocou a área para a 3L, que tem entre seus sócios familiares do deputado federal Leur Lomanto Jr. (DEM-BA). O deputado já foi acionista da empresa.

Gabriel Turiano, advogado da 3L, defende que a relação entre a 3L e a Infraero era regida pelas leis do direito público pelo fato de a empresa que administrava o aeroporto ser uma estatal. A partir do momento em que houve a concessão, ele defende que a relação com os concessionários deve ser a do direito privado.

“Nossa tese é inovadora. Não há case idêntico. As leis do direito público tinham um sentido de ser na época. Mas hoje mudou. Um aeroporto é um shopping”, afirmou Turiano.

Para ele, não é claro que, caso vencedora, a nova tese sobre o aluguel de área em concessões vá afetar as concessões.

“Isso depende. As empresas podem fazer due diligence antes das concessões e poderiam ter enxergado essa contingência”, disse Turiano.

Analisado pela ótica da Lei do Inquilinato, segundo Turiano, a 3L teria o direito a mais tempo de contrato por ter feito o desenvolvimento comercial da área. Ele defende um prazo de pelo menos cinco anos. Turiano reclama ainda que não houve diálogo adequado da Vinci com a atual arrendatária.

Valores abaixo do mercado
O advogado da Vinci, Pedro Trigo, da Fraga & Trigo Advogados, diz que chamou aos autos a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), a Infraero e a AGU (Advocacia-Geral da União) para que elas possam se pronunciar sobre o caso, já que afetará todo o sistema de concessões de aeroportos.

Ele explica que os valores pagos pela 3L são abaixo do mercado e que a manutenção de contratos como esses trazem prejuízo à concessionária e abalam as projeções feitas para a apresentação das propostas, desequilibrando o contrato. Segundo ele, houve assédio da 3L para que o contrato não fosse alterado.

A consequência de chamar a ANAC também foi que o processo poderá deixar a Justiça da Bahia, onde seguidas liminares estão impedindo que a Vinci possa retomar a área e oferecê-la ao mercado. Trigo aponta influência política do deputado Lomanto Júnior no processo. Procurado, o parlamentar não quis se pronunciar.

Para evitar que o processo saia da jurisdição estadual, os advogados da 3L entraram com recursos na Justiça estadual, ainda pendentes de julgamento. Com isso, o posto segue, ao fim do contrato, sendo administrado pela 3L.

“Competência é questão de ordem pública e o curioso desse processo é que os advogados insistem em que ele permaneça na Justiça da Bahia”, disse o advogado.

Reequilíbrios complexos
A mudança de tese de interpretação de leis nas concessões, especialmente as de aeroportos, carregam o risco de criar insegurança para todas as concessões num momento em que o governo pretende passar para a iniciativa privada toda a sua rede de aeroportos e incentiva que estados e municípios façam o mesmo.

Isso porque são raros os casos em que a ANAC reconhece o direito ao reequilíbrio nos contratos.

Recentemente, no julgamento de um pedido de reequilíbrio da Aeroportos Brasil, concessionária do Aeroporto de Viracopos (SP), a área técnica da agência entendeu que a empresa tinha direito a reequilíbrio de R$ 79 milhões devido ao uso da Receita Federal, sem pagar, de áreas do aeroporto para armazenar cargas que estão em análise para pena de perdimento.

Há outros casos de concessionárias de aeroportos que armazenam produtos de órgãos públicos sem qualquer tipo de ressarcimento.

No entanto, a Procuradoria da ANAC entendeu que a concessionária não tinha direito a reequilíbrio. A diretoria, então, tentou uma solução intermediária. Considerou que a empresa tem direito a receber da Receita Federal por armazenamento, mas negou o reequilíbrio no contrato de concessão.

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