Estudo encomendado pelo Ministério da Economia à PSR sugere abertura do mercado a partir de 2026

Roberto Rockmann, colunista da Agência iNFRA

A abertura total do mercado livre de energia elétrica deveria ser feita por etapas a partir de 2026 com base em lei que contemple avanços na regulação setorial. Ainda deve incluir um mecanismo para cobrir os custos desta transição a ser aplicado aos consumidores cativos, livres e autoprodutores para que essa mudança regulatória não onere ainda mais o ambiente regulado, que tem arcado com os custos da sobrecontratação com o avanço do mercado livre.
 
Esses são alguns dos pontos levantados em estudo da PSR feito para o Ministério da Economia e cuja última versão é de 16 de agosto. No documento, ainda se aponta que o excesso de recentes intervenções, como a contratação de 8 GW (gigawatts) de térmicas com 70% de inflexibilidade, criou encargos que afetarão a dinâmica com o mercado e o equilíbrio entre oferta e demanda, com consequência em preços.  
 
Lei de Acesso à Informação
Com mais de 600 páginas, ele ainda não foi tornado público e foi obtido por meio de um pedido feito por meio da Lei 12.527/2011, de Acesso à Informação, ao Ministério da Economia. O estudo foi comentado em um webinar realizado em 5 de agosto, o que ensejou a solicitação.
 
Foi encomendado pela Secretaria de Desenvolvimento de Infraestrutura com intuito de avaliar as implicações financeiras e econômicas de diferentes formas de estruturar a abertura do mercado livre para todos os consumidores. Dentre as preocupações da Secretaria estão as “diferentes arbitragens” que existem no setor e “privilegiam certos segmentos, comprometendo a ampla e justa concorrência.” 
 
Sobrecontratação 
As recentes intervenções, como a Lei 14.182/2022, que autorizou a capitalização da Eletrobras e em um parágrafo à la Saramago incluiu a contratação de 8 GW de térmicas com 70% de inflexibilidade, criaram encargos que afetam a dinâmica do mercado, elevaram a sobrecontratação do sistema nesta década e reduzem o GSF (risco hidrológico) abaixo de um nesta década. Esses fatores são exacerbados pelo forte crescimento da geração com custo marginal zero, como a usina nuclear Angra 3, o crescimento da geração distribuída e das demais renováveis já contratadas. 
 
Por exemplo, as térmicas a serem contratadas pela lei que permitiram a capitalização da Eletrobras elevam em seis pontos percentuais a sobreoferta entre 2022 e 2040. “Essa grande sobreoferta, aliada ao aumento de inflexibilidade operativa da matriz com fontes renováveis variáveis, pode levar a períodos de baixos preços e baixa geração hidrelétrica”, informa o estudo. As simulações ainda apontam um impacto de R$ 40 a R$ 50 o MWh no preço de curto prazo, considerados os preços-teto estipulados na lei.  
 
A PSR estima que a sobreoferta física de energia elétrica, entre 2022 e 2030, pode superar 20% em média em alguns anos nesse período. Isso se alia ao fato de que o GSF deve permanecer abaixo de um em boa parte desta década, o que significa que as hidrelétricas, que respondem por mais da metade da eletricidade gerada no país, não conseguirão gerar ao menos a sua garantia física. A sobreoferta tende a pressionar os preços do mercado físico para baixo, o que pode reduzir margens de agentes que já negociam contrato, se tornar a migração para o mercado livre ainda mais vantajosa. 
 
Nesse cenário, o estudo aponta que o desafio da abertura é realizar a transição para a abertura total com avanços regulatórios sem que ocorra a “espiral da morte”, em que a maciça migração criaria, de um lado, problemas financeiros para as distribuidoras e, de outro, um custo ainda em aberto no mercado regulado. O documento ainda aponta que a abertura total não implica diretamente em redução na conta de luz, já que há necessidade de aperfeiçoamentos regulatórios, alguns que poderão vir com aprovação do Projeto de Lei 414 e outros que dependerão de medidas infralegais.  
 
Contratos legados 
Nos cálculos da PSR, as distribuidoras atualmente possuem um volume relevante de energia já contratada para os próximos anos, suficiente para atender 50% do mercado até 2030. Resolver isso é nevrálgico.

“A preocupação dos agentes associados aos contratos legados nos parece legítimas e urgentes, especialmente no contexto da abertura do mercado para consumidores da baixa tensão – aproximadamente 60% do mercado atual – e considerando o framework atual que aloca exclusivamente aos consumidores regulados os custos decorrentes da sobrecontratação devido à migração para o ACL”, aponta o estudo.  
 
Por conta disso, são indicadas três ideias. A primeira se refere a aprimoramentos e criação de mecanismos para as distribuidoras gerenciarem seus portfólios. Para isso, há o Mecanismo Competitivo de Descontratação, instituído pela Lei 14.120, “mas ainda sem regulação pelo poder concedente e agência reguladora”. 
 
O segundo ponto seria evitar a criação de novos contratos legados com longa duração. Em relação aos leilões de energia nova, caso sejam realizados novos, a sugestão é trabalhar com prazos de contratos mais curtos, com duração de até 15 anos. Caso o governo decida por suspendê-los, opção mais plausível no caso da abertura total, a recomendação seria fazer leilões de energia existente com contratos de duração de até cinco anos.  
 
O terceiro ponto é o mais delicado (por não existir consenso sobre ele no mercado) e se refere aos custos dos contratos legados. O modelo atual, sancionado em 2004, é baseado na contratação de energia pelas distribuidoras em leilões anuais, em que os geradores ofertam energia em contratos de longo prazo, que valem de 25 a 35 anos, o que também contribui para financiar os projetos. São os chamados contratos legados. Abrir o mercado implica resolver os contratos legados e redefinir o papel das distribuidoras, por exemplo com a separação entre fio e energia. 
 
Uma das opções é a cobrança de um encargo de sobrecontratação, o que está previsto no PL 414. A questão é de quem será cobrado. Hoje o mercado regulado arca com os custos. Em sete cenários analisados, o estudo aponta que, se apenas os consumidores cativos arcassem com o encargo, o custo médio poderia ficar entre R$ 37 e R$ 60 o MWh. Caso ficasse com todos, o custo médio cairia para R$ 10 a R$ 16 o MWh.

Uma abertura em etapas a partir de 2026 asseguraria custos menores. O faseamento seria capaz de reduzir o encargo de sobrecontratação entre R$ 6 e R$ 8 o MWh. No estudo, indica-se que um prazo de abertura mais alongado possibilitaria uma melhor “concatenação com o término de alguns contratos legados de distribuidoras, resultando em menores encargos de sobrecontratação”.  
 
Prazo da abertura 
 O Projeto de Lei 414/2021, que trata da abertura total do mercado e está na Câmara dos Deputados, fixa em 42 meses após sua sanção a liberalização do mercado livre, incluindo-se as residências. No estudo, a PSR pondera que “seria desejável que os estudos que respaldam as medidas necessárias para esse plano de implementação fossem amplamente divulgados à sociedade com antecedência ao prazo de implementação da abertura”.

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