Engie notifica clientes sobre a entrega apenas da energia efetivamente consumida

 Ludmylla Rocha e Leila Coimbra, da Agência iNFRA

A Engie Brasil, maior produtora privada de energia do país, notificou, no começo de outubro, parte dos clientes com os quais tem contrato de venda de energia atrelado ao consumo, para a entrega abaixo do nível mínimo de flexibilidade previsto.
 
Na prática, significa disponibilizar para os clientes apenas a energia efetivamente utilizada, e não o que foi contratado dentro dos limites de flexibilidade. A notificação foi feita pela Engie apenas no mercado livre, não no regulado.
 
Nesse tipo de acordo (flexível), é possível receber menos energia que o contratado, no “limite inferior”, ou também um percentual a mais, no “limite superior”.  Esse percentual é negociado caso a caso, mas é em média de 10%.
 
Mercado reagiu à iniciativa
A medida repercutiu mal entre os agentes, como uma espécie de “racionamento às avessas”, ou a aplicação do chamado “Fato do Príncipe”, cláusula introduzida nos contratos depois de 2001 para proteção das empresas geradoras de energia em caso de redução compulsória de consumo.
 
Segundo executivos que não quiseram se identificar, a Engie considerou que medidas como a RVD (Redução Voluntária da Demanda); a Bandeira de Escassez Hídrica; mais as resoluções da CREG (Câmara de Regras Excepcionais de Gestão Hidroenergética) configurariam o “Fato do Príncipe”, portanto, justificariam a entrega de energia abaixo do limite inferior dos contratos.
 
“Isso é péssimo. Estão usando esse pretexto para arbitrar a flexibilidade dos contratos dos consumidores em benefício próprio”, disse uma fonte que preferiu o anonimato.
 
“Sem quebra de contrato”
A Engie declara não se tratar do caso. “A gente não está quebrando contrato, a gente nunca fez isso. Jamais vai fazer isso”, disse o diretor de Comercialização da companhia, Gabriel Mann, à Agência iNFRA.
 
“A gente tem uma previsão contratual estabelecida em alguns contratos e que foi, portanto, acordada pelas partes, onde tanto a situação de redução de consumo obrigatória, porque a legislação chama de racionamento, ou uma situação voluntária, que são medidas de racionalização de consumo – são nesse aspecto tratadas da mesma maneira em termos de entrega de energia e faturamento”, explicou o diretor da Engie.
 
“Se ele [cliente] consumiu abaixo desse limite inferior, ele recebe o limite inferior e me paga. Se ele consumir acima do limite superior, eu entrego o limite superior, ele me paga e vai buscar no mercado o restante da energia. Esse é o contrato tradicional atrelado ao consumo”, explicou.
 
O diretor da companhia argumenta que a medida [notificação] atinge uma parcela de pouca representatividade na cartela de clientes da empresa, que são exclusivamente comerciais e industriais, de forma a não prejudicar as comercializadoras de energia. Afirma ainda que os clientes acionados foram apenas os que estavam consumindo abaixo do limite inferior de volume contratado.
 
“Dentro do que a gente acordou com o cliente no contrato, esse é o nosso entendimento, estamos numa situação na qual existe um incentivo à redução voluntária e, portanto, eu deveria aplicar essa condição excepcional do faturamento da entrega da energia.”
 
Resistência dos clientes
A empresa admite, no entanto, que houve resistência por parte dos clientes. Com o preço da energia em alta no mercado de curto prazo é comum que empresas que não estejam consumindo tudo o que compraram no mercado livre revendam a energia excedente com um valor superior ao que foi adquirida.
 
Mann afirmou que a Engie está mantendo a entrega prevista inicialmente, sem o acionamento da cláusula, mesmo entre aqueles que foram notificados. A ideia é que a questão seja negociada e ocorra um processo de mediação. Se houver o entendimento de que a companhia está correta em sua interpretação, que os efeitos econômicos sejam ajustados posteriormente.
 
A empresa argumenta, no entanto, que tem prevista em parte dos contratos de consumo a cláusula de possibilidade de redução dessa flexibilização em caso de racionamento, e a redução de demanda voluntária também está prevista em legislação. Por isso, interpreta que medidas como os programas de economia propostos tanto para o mercado livre quanto para o regulado e a determinação da bandeira tarifária “escassez hídrica” permitem acioná-la [a cláusula] neste momento.
 
Nesse caso, o limite inferior deixa de existir e o consumidor paga pelo faturado. Já a margem para consumo acima do limite superior sofre redução.
 
O contexto da medida
A Engie Brasil tem quase 80% de seu portfólio coberto por geração hidrelétrica, mas no atual contexto de crise hídrica as usinas estão sem água em seus reservatórios. Com isso, a companhia é afetada pelo GSF (Generation Scaling Factor, ou risco hidrológico), cálculo que considera a energia efetivamente gerada pelas usinas hidrelétricas frente à sua garantia física. Com a possibilidade de geração por esta fonte prejudicada, as gestoras precisam recorrer ao mercado para comprar energia de outras fontes e suprir seus contratos.
 
“Ao mesmo tempo que eu estou fazendo frente ao problema do GSF, eu tenho que, num contrato onde eu tenho uma proteção que a gente acordou na hora que assinou, entregar mais energia que não está sendo usada e está sendo revendida. Esse é o nosso dilema, o nosso entendimento, que é difícil você justificar não exercer”, conclui o diretor.
 
Ele afirma ainda que a área de assuntos regulatórios da companhia está atuando junto ao governo, seja diretamente ou por meio de associações, para que a condição de companhias geradoras de energia afetadas pela crise seja considerada.

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