Audiência sobre novo terminal de contêineres de Santos terá disputa sobre verticalização

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

A verticalização do setor de transporte e armazenagem de contêineres será o grande ponto de debates na sessão presencial da Audiência Pública 6/2022 da ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), prevista para hoje (19), às 10h, para tratar da proposta de arrendamento do STS10, o novo terminal de contêineres no porto de Santos (SP). 

De um lado, está a defesa da proposta do governo de fazer uma limitação de participação apenas de uma das atuais grandes operadoras de contêiner do porto, a BTP. De outro, empresas demandam por meio de associações do setor que essa restrição se amplie aos atuais controladores da BTP, a TiL (Terminal Investment Limited), do grupo Maersk, e a APM Terminals, do grupo MSC.

A proposta do governo, conforme mostrou reportagem da Agência iNFRA, disponível neste link, é que somente haja restrição a um consórcio formado por qualquer das companhias controladas por Maersk ou MSC para entrar no STS10. Se forem sozinhas, elas podem entrar na disputa.

Essa disputa está num contexto internacional de tentativa de restrição da verticalização dos armadores de contêineres (quando eles também são donos de terminais) e suas operações em conjunto por parte de órgãos reguladores de concorrência na Europa e nos EUA.

No Brasil, há uma investigação no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre o tema, a pedido da Abtra (Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados). Nela, foi apresentado um parecer assinado pelos economistas Paulo Springer de Freitas, Luiz Alberto Esteves e Marcio de Oliveira Junior, os dois últimos ex-economista-chefe e ex-presidente do Cade.

Self preferencing
No trabalho, eles indicam que no caso de a BTP ou qualquer dos armadores que a controlam vencer a disputa, as chances de se ampliar o que é classificado como conduta de self preferencing adotada atualmente por Maersk e APM Terminals em Santos vai se ampliar.

“Uma licitação de infraestrutura deve ter como princípio norteador o aumento da competição, com consequente ganhos de eficiência. No caso de Saboó, contudo, a vitória de Maersk/APMT, MSC/TIL e/ou BTP, seja por meio de participação conjunta, seja por atuação independente das partes, resultará em deterioração das condições de concorrência no Porto de Santos”, conclui o trabalho.

Ao longo do estudo, são apresentados vários números indicando que os navios da Maersk e da MSC e suas subsidiárias de navegação usam preferencialmente o terminal da BTP, especialmente para operar com contêineres de maior valor agregado. 

Chances de atracações
Isso ocorre, de acordo com o trabalho, mesmo sem o BTP ser o terminal mais eficiente em operação no porto, que tem outros dois terminais de contêineres de grande porte que não são associados a empresas de navegação, o Santos Brasil e DPWorld. As atracações nos outros dois terminais de contêineres têm mais chances de ocorrer, segundo o levantamento, quando o terminal da BTP já está com seus berços de atracação cheios. 

“Mais de 2/3 das atracações de navios Maersk/MSC na Santos Brasil ou na DPW ocorrem quando há pelo menos dois dos três berços da BTP ocupados”, mostra o trabalho.

Isso indica, para os autores, que se ocorrer uma maior capacidade para alguma das empresas associadas ao BTP, haverá ampliação da conduta de self-preferencing. O sócio de Caminati Bueno Advogados, Eduardo Caminatti, advogado que representa a Abtra no processo no Cade, defendeu que a conduta classificada como anticompetitiva só não é maior porque o BTP não tem mais espaço. Por isso o pedido para que suas controladoras sejam impedidas.

O parecer foi levado ao processo do Cade onde a BTP e suas associadas negam qualquer prática anticoncorrencial. Não há ainda decisão do órgão de defesa da concorrência sobre o tema. Caminatti afirmou que há mais de um ano foi pedida pela associação uma medida preventiva no processo, o que não ocorreu.

“Apesar da competência e da qualificação técnica de nossos órgãos reguladores, investigações e processos relacionados a condutas anticompetitivas tendem a ser um pouco morosos, inclusive pela complexidade do tema”, disse o advogado. 

Redução de preços
A BTP havia encomendado estudo, de Peter W. de Langen, consultor na área de portos e logística e professor da Copenhagen Business School, indicando que o porto de Santos tem concorrência em nível com o de grandes portos internacionais. A reportagem sobre o tema está neste link.

Outro trabalho, de março de 2022, da Portplan Consultoria, Planejamento e Engenharia Portuária, assinado pelo diretor Guilherme Soares de Sá Peixoto, engenheiro e ex-diretor da Libra Terminais, indica que a entrada do BTP no porto de Santos ampliou a concorrência e fez com que os preços pagos pelos usuários pelos contêineres baixassem de uma média de US$ 399 em 1998 para US$ 108 em 2021.

Outro dado do levantamento é que o tempo médio de espera dos navios de contêineres caiu de 34 horas em 1996 para 21 horas em 2021, o que daria uma economia anual da ordem de US$ 134 milhões.

Patrício Júnior, diretor de investimentos e terminais da multinacional TiL, diz que, mesmo com a vitória de um dos atuais acionistas da BTP, haverá mais competição no porto de Santos com a implantação do STS10.

Segundo ele, a verticalização é um processo que acontece em várias cadeias produtivas no mundo. Ele cita recentes informações de que redes de supermercados e lojas online estão se utilizando de navios e aviões próprios, para defender que o processo pode ser benéfico ao consumidor, lembrando a redução de custo da movimentação de contêineres em Santos.

“Cavaleiros do apocalipse”
Ele recorda ainda que, quando o BTP e o DPW iniciaram suas operações em Santos, na década passada, havia “cavaleiros do apocalipse” defendendo que o porto entraria em colapso com esses novos operadores.

“Você pode imaginar o porto de Santos sem esses dois operadores hoje? Seria o caos”, afirmou Júnior.
O diretor da TiL afirmou ainda que as empresas de navegação fazem seus acordos de preferência por meio de contratos com dois anos de duração, os chamados TSA (Terminal Service Agreement), que levam em conta análise de preço e qualidade de serviço.

De acordo com ele, em Santos, há operações dos armadores donos do BTP nos outros terminais concorrentes. E outros armadores não atracam no BTP e usam preferencialmente os outros terminais.

“Nós queremos competir. Se a tentativa for ganhar mais com ineficiência, vamos ter problemas sérios. Queremos ganhar muito, com muito mais eficiência, fazendo o consumidor pagar menos em um volume maior”, afirmou Júnior.

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