ANP vai estudar medidas para reduzir poder da Petrobras na área de gás

Roberto Rockmann*

A diretoria da ANP (Agência Nacional do Petróleo) decidiu por unanimidade, em reunião pública nesta quinta-feira (25), iniciar a elaboração de análise de impacto regulatório sobre a desconcentração do mercado de gás natural via o programa Gas Release (leilões que a Petrobras poderia fazer para liberar gás para o mercado) e incluir o tema em sua agenda regulatória desse ano.

Também foi decidido que a Nota Técnica que contempla o diagnóstico concorrencial da indústria de gás será enviada para o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) e se tornará pública.

Em seus votos, divulgados nesta quinta-feira à tarde, os diretores foram enfáticos em destacar que a concentração de poder nas mãos da Petrobras precisa ser enfrentada e que a decisão representava um momento histórico. Foram apresentados dados que apontam que o índice de concentração no setor no Brasil está em cerca de sete mil pontos. Dados do Departamento de Justiça dos Estados Unidos indicam que setores com pontuação acima de 2.500 mostram alta concentração.

A decisão da ANP poderá criar uma saia justa para o governo federal, para o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) e para a Petrobras e expor conflitos de interesse em meio à abertura mais acelerada do setor desde 2019, com a nova Lei do Gás. Também deverá acirrar a pressão da indústria em relação a preços mais baixos. Há preocupação de retrocesso na indústria principalmente em relação à abertura do setor no Nordeste, menos concentrado.

Todo o processo que levou à votação nesta quinta-feira, 25, na reunião da ANP foi conduzido sob uma resolução do CNPE de 2022, no governo anterior. Isso põe em dúvida os próximos passos no atual governo, ainda mais em momento em que a Petrobras tem dito que irá disputar cada metro cúbico diário de gás.

O superintendente de Defesa da Concorrência da ANP, Luis Eduardo Esteves, apontou que a Petrobras detém a liderança na produção nas Bacias de Campos e de Santos, com mais de 68% da produção nas duas principais regiões de produção de óleo e gás do país. No Recôncavo Baiano, a presença cai para 23%. Já em relação às vendas, a estatal deteve 83% de liderança entre janeiro e novembro de 2022. “Não se notaram grandes avanços na concorrência, com exceção do Nordeste.”

O índice de cálculo de concentração do setor é alto. No Brasil, ele está em 6.963 pontos, sendo que no Sudeste está em 9.795. O indicador vai até dez mil pontos. Já no Nordeste cai para 2.393 pontos. “Dados do Departamento de Justiça dos Estados Unidos indicam que setores com pontuação acima de 2.500 mostram alta concentração”, afirmou Helio Bisaggio, superintendente de Infraestrutura e Movimentação na ANP.

Com o diagnóstico, a ANP votou para começar a avaliar medidas para reduzir a concentração. “A concentração precisa ser enfrentada”, disse o diretor Fernando Moura em seu voto. “Sou integralmente favorável a essa proposta, e esse dia mostra que amadurecemos no mercado de gás natural”, disse a diretora Symone Araújo, que ainda frisou que o programa de gas release poderá ser diferente a cada região a que será aplicado, já que a concentração regional no Nordeste é diferente da vista no Sudeste.

A reunião da ANP evidenciou um fato que tem sido levado pelos industriais ao governo federal: as chamadas públicas de distribuidoras de gás do Nordeste, buscando outros supridores, e a Petrobras tendo reduzido sua participação nele, contribuíram para a redução dos preços. Segundo a ANP, no Nordeste, a redução de preço foi de 18%.

Fica a dúvida se a reunião de ontem representou mesmo um passo histórico. O presidente da estatal, Jean Paul Prates, tem dito que a Petrobras irá disputar cada metro cúbico e milhão de BTU existentes no mercado com o melhor preço e que essa política de precificação dependerá da quantidade, local de entrega e do cliente.

Entre 2024 e 2027, a empresa deverá aumentar sua oferta em mais de 50 milhões de metros cúbicos por dia com novos projetos de gás e biometano entrando em operação. “É um gás para não depender de importação e eu vou baixar os preços, se precisar, e isso render reclamação no órgão de concorrência eu vou me defender e dizer que estou praticando o preço porque eu posso”, disse Prates.

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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