Análise: Novo ministro tem uma agenda de questões para se inteirar, algumas urgentes

Roberto Rockmann*

Antes de tomar posse como ministro, o então senador Alexandre Silveira (PSD-MG) estava se inteirando dos futuros desafios à frente do MME (Ministério de Minas e Energia), cargo que assumiu oficialmente nesta segunda-feira (2), enquanto as entidades do setor elétrico articulam as pautas que levarão aos primeiros encontros com o novo governo.

Solar: PL 2.703 retornará à pauta?
O PL (Projeto de Lei) 2.703/2022, que estende o prazo dos subsídios para a mini e microgeração distribuída solar por seis meses, foi aprovado na Câmara em dezembro, mas na reta final não foi apreciado pelo Senado. O setor não desistiu. Como os parlamentares voltam de recesso apenas em fevereiro, o PL só voltará a ser discutido depois do término do prazo inicial estipulado pela Lei 14.300 (de 6 de janeiro deste ano) para o fim integral dos subsídios.

A intenção dos empresários é fazer com que o PL 2.703 possa ter caráter retroativo, abarcando todos os consumidores que realizem solicitação de acesso perante as distribuidoras a partir da segunda semana de janeiro. Nos últimos dias, eles têm recolhido dezenas de casos de investidores com dificuldades em fazer pedidos às distribuidoras para conexão de novos sistemas solares. Consultorias que atuam na área têm trabalhado quase 20 horas diárias para a inserção dos pedidos e das solicitações nos sistemas das distribuidoras.

Há ainda expectativa no setor em relação à decisão do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) sobre a valoração dos atributos da mini e microgeração solar. Na Lei 14.300, estabeleceu-se que o CNPE teria seis meses para estabelecer as diretrizes para valoração dos custos e dos benefícios da microgeração e minigeração distribuída, enquanto a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) teria 18 meses para os cálculos. O assunto deveria ter sido discutido pelo CNPE nas reuniões de novembro e dezembro, mas ficou para o novo governo.
 
Distribuição: Amazonas Energia preocupa
No setor de distribuição, um problema que ganhou importância em conversas com a equipe de transição foi o caso da Amazonas Energia, última distribuidora vendida pela Eletrobras, que se desfez da empresa em leilão em dezembro de 2018. Altas perdas na área de concessão, problemas com o governo local e dificuldades financeiras da concessionária têm levado preocupação sobre os serviços. Busca-se ainda uma solução de mercado. 

O setor de distribuição também se prepara para discutir as regras sobre a renovação ou relicitação dos ativos que começarão a expirar a partir de 2025, sendo a concessão da EDP no Espírito Santo a primeira da fila. Há a expectativa de que não haja grandes mudanças nos contratos. Um indício é o fato de a Enel ter colocado à venda sua concessão de distribuição no Ceará, o que tem atraído investidores interessados. A distribuidora é uma que deverá ser submetida ao processo de renovação ou relicitação dos ativos.

Mercado livre
A pauta número um da comercialização é a abertura total do mercado livre. Nos últimos dois meses do governo, buscou-se até uma solução infralegal para realizá-la, mas não se avançou. Discutido há duas décadas, o assunto voltará à pauta. A equipe de transição, que apontou preferência pela abertura a partir da discussão e aprovação do PL 414, também se mostrou preocupada com o equacionamento dos contratos legado, criação de novos subsídios principalmente aos consumidores que permanecem no mercado regulado.

PCS: Portaria 55 estabeleceu 60 dias
No fim do ano passado, o governo Bolsonaro editou a Portaria 55, que estabeleceu diretrizes e condições para a resolução amigável dos Contratos de Energia de Reserva firmados em decorrência do PCS (Procedimento Competitivo Simplificado), realizado em 25 de outubro de 2021. A portaria estipula a rescisão unilateral e cobrança de multa para geradores inadimplentes – 10 usinas contratadas pelo PCS não entraram em operação no prazo e devem pagar mais de R$ 9 bilhões em multas. Com a rescisão unilateral dos contratos, os consumidores ficam dispensados do pagamento de R$ 30,8 bilhões. De acordo com o MME, as diretrizes da portaria podem reduzir em até 4,5% as tarifas nos próximos três anos.

O texto foi celebrado por entidades de consumidores, mas visto com ressalvas por especialistas, por não trazer condições ou opções de negociação e por ter atribuído indiretamente à ANEEL as condições para o andamento do processo. “A portaria terá alcance muito limitado e com potencial muito aquém de sucesso e cumprimento da determinação do TCU [Tribunal de Contas da União]. Ter incluído a opção negocial era uma opção gratuita que o governo poderia ter feito”, afirma uma fonte.

Como o prazo estipulado para os que aceitarem as propostas é de 60 dias, a ser encerrado no fim de fevereiro, há dúvidas se a portaria será mantida pelo novo ministro de Minas e Energia, se poderão ser feitos acréscimos ou se poderá ser feita extensão do prazo. Há incerteza se o texto foi alinhado com a equipe de transição.

Leilões
Em 22 de dezembro, o governo Bolsonaro lançou o cronograma que define que, durante o triênio 2023-2025, estão previstos sete leilões em cada ano: o Leilão de Reserva de Capacidade, nos termos da Lei 14.182, de 2021, nos meses de julho; os leilões “A-4” e “A-6” nos meses de agosto; o Leilão para Suprimento aos Sistemas Isolados, nos meses de outubro; o Leilão de Reserva de Capacidade na forma de potência, nos meses de novembro; e os leilões “A-1 e “A-2”, nos meses de dezembro de cada ano.

Com a pauta da abertura do mercado livre, fica a pergunta se esses leilões serão mantidos e se continuarão contratando energia em contratos de mais de 20 anos. Quanto maior contratação de longo prazo, mais contratos legados estão sendo feitos. 

Térmicas da Eletrobras
O cronograma estabelecido pelo governo Bolsonaro, divulgado em 22 de dezembro, aponta que em julho deste ano será feito o segundo leilão para contratação de térmicas sob a Lei 14.182, que autorizou a capitalização da Eletrobras, mas criou a contratação de 8 GW de térmicas a gás natural em alguns pontos em que não se tem acesso ao insumo. Esse é um dos pontos mais controversos apontados pela equipe de transição. As térmicas ampliariam a sobreoferta de energia e ainda acarretariam um custo de R$ 368 bilhões aos consumidores, nas contas da equipe de transição. 

O primeiro leilão foi realizado em setembro, com a contratação de 750 MW, no Norte, dos 2 GW previstos. O certame pretendia a contratação de 1 GW no Norte e 1 GW nos estados do Maranhão (300 MW) e do Piauí (700 MW).

Eliminar a exigência da contratação, estabelecida em lei, não será tarefa fácil. Uma das ideias da equipe de transição era estabelecer um decreto sustando a exigência, mas o instrumento legal é mais frágil do que uma lei. A contratação é vista com bons olhos por parte expressiva do Congresso. Como o governo terá na área de energia de discutir a atenuação de aumentos sobre os preços dos derivados de petróleo e uma nova forma de atuação no refino, poderá ficar sem poder de barganha para negociar o fim da exigência de contratação das térmicas da Eletrobras.

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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