Análise: interferência em preço de combustíveis é problema histórico

Roberto Rockmann*

Sancionada em agosto de 1997, a Lei 9.478 quebrou o monopólio da Petrobras na área de óleo e gás no Brasil. Nesses 25 anos, por uma série de fatores, o país não tem uma política estável de preços de combustíveis, sendo que os humores presidenciais sempre influenciam o rumo do preço do diesel e da gasolina. Já em gás natural ou asfalto a liberdade é maior.

Em 2002, apesar da disparada do câmbio, o governo FHC não alterou as cotações dos derivados de petróleo. Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff seguraram por anos cotações de petróleo, o que teve duplo prejuízo: para a Petrobras e para o setor sucroalcooleiro.

Michel Temer tentou praticar uma política de reajuste quase diária, o que levou à queda de Pedro Parente à frente da estatal, depois de uma greve de caminhoneiros que parou o país. Jair Bolsonaro agora aponta na direção de nova intervenção no preço dos combustíveis, que apontam uma defasagem de 50% em relação às cotações internacionais. Estima-se no mercado que os subsídios possam chegar a R$ 12 bilhões mensais.

O contexto atual tem suas particularidades. O governo norte-americano aponta que as sanções contra a Rússia poderão chegar ao petróleo. Para o ex-presidente do banco Fator Gabriel Galipolo, as ações políticas estão atrás do mercado. “O óleo russo já é vendido com 30% de desconto em razão da dificuldade de encontrar compradores. O mercado está bem apertado”, diz Galipolo. A Rússia responde por 7% do mercado mundial.

Ao interferir no preço dos derivados, fica a dúvida de como ficará o plano de desinvestimento da Petrobras, com destaque à venda de refinarias. A primeira foi vendida no fim do ano passado. Outras seriam feitas no segundo semestre. Continuarão? Como fica o apetite dos investidores? As eleições presidenciais mudarão o ritmo? Os preços controlados dos derivados terão impacto sobre o etanol e biodiesel? Em reunião sobre o programa de energia do candidato Lula, houve discussões acirradas sobre que se fazer com o refino.

Em gás natural, os preços do GNL (gás natural liquefeito) estão em níveis recordes. Novos terminais poderão ter sua construção acelerada nos Estados Unidos, na Ásia e na Europa, mas isso ainda leva tempo. A disparada das cotações já tem feito analistas ficarem de olho no mercado de energia elétrica brasileiro.

Os contratos de gás são de longo prazo, mas os preços recordes na Europa e a busca emergencial de países europeus de reduzirem suas importações da Rússia poderão levar a quebras de contrato em países secundários para atender o mercado em forte alta. Isso poderia ter impacto sobre o fornecimento de termelétricas no Brasil.

Mas esse cenário também tem suas oportunidades. “Ele traz o gás do pré-sal para dentro da equação energética. Se bem estruturado, esse gás pode reduzir nossa dependência a preços internacionais com o GNL”, afirma Luiz Barroso, presidente da PSR.

Oportunidades também estão nas renováveis. Alemanha, Espanha e outros países europeus avaliam não descontinuar plantas nucleares e a carvão, ou seja, consideram mantê-las em operação mais tempo do que o previsto. Muitas empresas desses países têm metas de redução de carbono para as duas próximas décadas.

Nesse curto prazo, elas poderão elevar suas emissões em seus países de origem em razão das consequências do conflito Rússia-Ucrânia. O Brasil, com sua pegada de carbono, então poderia se tornar ainda mais o centro dessas empresas em energia limpa? Isso não vai influenciar fusões e aquisições e ainda mais investimentos em energia limpa por aqui no Brasil, principalmente de empresas europeias com negócios no Brasil? “É uma leitura plausível”, diz Fernando Lopes, diretor do Instituto Totum, emissor no Brasil dos certificados de energia renovável.

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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