Análise: indefinição sobre Petrobras reduz velocidade de abertura do mercado de gás

Roberto Rockmann*

A velocidade de abertura do mercado de gás natural a novos players, que vinha sendo ancorada desde 2015 com o plano de desinvestimento da Petrobras e se acelerou com a Lei 14.134/2021 (Nova Lei do Gás), ganhou um grande ponto de interrogação na nova gestão da empresa. Maior explorada e produtora de gás do país, com a curva de crescimento da produção no Pré-Sal e limites para queima e reinjeção do insumo, a postura da estatal tem sido acompanhada de perto.

Existem muitos questionamentos no setor sobre qual a estratégia da Petrobras a respeito do gás natural: o TCC (Termo de Cessação de Conduta) assinado entre a empresa e o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) será levado totalmente, parcialmente ou não será levado adiante? na área de transporte de gás, a TBG (Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil), com participação de 51% da estatal, será vendida? a TBG ganha importância em um momento em que o trecho sul do Gasbol (gasoduto Bolívia-Brasil) poderá ser ampliado, para aumentar a oferta para os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul?

“TCC com o Cade não deve seguir adiante”
Para o ex-diretor geral da ANP (Agência Nacional do petróleo) David Zylbersztajn, a Petrobras não deve seguir o TCC assinado pelo Cade, com a reorientação dos investimentos da estatal pelo novo governo. Isso terá impacto não apenas sobre o setor de gás, mas também com investimentos em refinarias.

“O setor de gás continua com uma abertura indefinida em um contexto mais complexo porque vários players privados vieram ao país nos últimos anos com investimentos diante dessa potencial abertura”, diz.

Mas dúvidas não param por aí. Qual será a postura da Petrobras no Nordeste, região na qual, em 2021, deixou de ser fornecedora de gás de distribuição e que responde por um quinto do mercado de gás do Brasil? Como ficará o programa Gas Release, leilões que a Petrobras poderia fazer para liberar gás para o mercado e que foram apontados como uma das diretrizes a serem levadas adiante por Resolução do ano passado do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética)? Como a Petrobras irá lidar com clientes livres? O gás que a União tem direito pelo regime de partilha será destinado à indústria?

Abertura do mercado
O presidente da Comerc Gás, Pedro Franklin, destaca que a velocidade de abertura está em xeque com as dúvidas sobre a mesa. “Estamos acompanhando”, diz. Um dos símbolos da abertura no ano passado – as chamadas públicas de distribuidoras de gás do Nordeste buscando supridores e a Petrobras tendo se ausentado desse mercado – agora é incerteza diante da indefinição do que a estatal fará.

No fim de fevereiro, a Petrobras assinou acordo de fornecimento do insumo com a Potigas, do Rio Grande do Norte, estado de Jean Paul Prates, presidente da estatal. Em fevereiro, industriais estiveram com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. No encontro, destacaram que as chamadas públicas no Nordeste implicaram em redução de 40% dos preços para os consumidores. Mantê-las na região e reforçá-las regionalmente seriam dois pontos essenciais para fortalecer a indústria.

Há também interesse da indústria sobre a parcela de gás da União nos contratos do regime de partilha. O insumo, que é do Estado, poderia ser alocado a preços baixos em um contexto em que a guerra entre Ucrânia e Rússia elevou a procura pelo gás. Nesse sentido, já se nota uma queda de braço entre a indústria química e o restante dos consumidores por esse gás mais barato.

Gasoduto Subida da Serra
Na conversa com o ministro, os industriais também discutiram a importância da discussão regulatória em torno do Gasoduto Subida da Serra, em São Paulo, que interligaria um terminal de regaseificação e uma nova unidade de processamento de gás natural, diretamente à malha de distribuição da Comgás.

Hoje o assunto está cercado em uma ampla discussão regulatória e jurídica se o gasoduto é de transporte ou de distribuição. É um assunto que envolve bilhões de reais sobre a mesa. As indústrias buscam que ele seja classificado como de transporte.

De outro lado, a Comgas busca que ele seja incorporado ao seu portfólio, sendo considerado de distribuição. O ministro disse que o governo acompanha o assunto. Os industriais também destacaram preocupação com a posição da Cosan, controladora da Comgas e que tem participação em outras distribuidoras de gás e também na área de comercialização, além de agora deter fatia na Vale, grande consumidora de energia.

No PIG (Plano Indicativo de Gasodutos de Transporte), a EPE indicou potencial construção de cinco novos gasodutos para a interiorização do gás – como ficará a Petrobras nesse contexto? Os 6 GW de termelétricas sob a lei que autorizou a capitalização da Eletrobras serão construídos e terão alguma participação da Petrobras? A PPSA será usada de novo para financiar a construção de gasodutos?

Alienação de ativos
No início desse mês, a Petrobras anunciou que recebeu ofício do Ministério de Minas e Energia solicitando a suspensão das alienações de ativos por 90 dias, em razão da reavaliação da Política Energética Nacional atualmente em curso e da instauração de nova composição do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

Nas duas próximas semanas, dois eventos serão acompanhados de perto pelos empresários do setor. Na quarta-feira, 15, em Brasília, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) realiza um evento sobre o programa Gas Release. Em 23, no Rio de Janeiro, a FGV Energia discutirá a indústria do gás com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates.

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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