LUIZ AUGUSTO BARROSO,

PRESIDENTE DA EPE (Empresa de Pesquisa Energética)

 

Leila Coimbra, da Agência iNFRA

O presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), Luiz Augusto Barroso, falou à Agência iNFRA sobre o novo modelo do setor, que está prestes a ser encaminhado ao Congresso Nacional.

Barroso defendeu a livre formação de preços prevista no novo arcabouço, mas disse que será preciso criar um mecanismo de controle de práticas abusivas de mercado. Esse órgão poderia ser criado nos mesmos moldes do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), ou, em última instância, essa função poderia ser feita pelo regulador (ANEEL).

Uma outra novidade, segundo o presidente da EPE, seria a criação de um mercado de comercialização de certificados de energia limpa, que traria uma receita extra para as fontes renováveis (PCH, biomassa, eólica e solar). “Os projetos teriam um prêmio financeiro pelo fato de que produzem energia limpa”, afirmou Barroso na entrevista.

Qual a espinha dorsal do novo modelo?
O objetivo é a gestão de risco descentralizada. Os agentes serão responsáveis pelas suas tomadas de decisão, e as consequências. A centralização é a causa da judicialização que existe hoje na indústria de energia, já que os preços são formados pelo ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), com base em modelos computacionais. Com a formação de preços por ofertas dos próprios agentes, eles serão os responsáveis.

Como funcionará esse leilão de formação dos preços pelos agentes?
Em vez do ONS calcular o preço da água de forma centralizada, e das termelétricas ofertarem energia com custos auditados, os agentes vão fazer seus próprios lances de quantidade e o preço que eles estão dispostos a vender a energia. Aí a operação (feita pelo ONS) vai cruzar esses lances com a demanda em uma ordem de mérito, exatamente como é feito hoje.

Qual o objetivo dessa mudança?
Cada um deve ter mais controle do seu recurso, que no caso das hidrelétricas é o seu reservatório. Hoje, o reservatório esvazia, e o cara tem um problema de GSF (sigla para o risco hidrológico), ele culpa o governo. Na formação de preços por oferta, quem é responsável por controlar o reservatório é o próprio agente. Se ele esvaziou, ele terá que pagar, foi uma decisão dele.

A partir de quando ocorreria esse novo sistema de preços?
A partir de janeiro de 2022, segundo o texto do PL (projeto de lei), depois de um ano de testes.

Mas para cumprir esse cronograma o projeto teria que ser aprovado neste ano, não? Ainda nem foi enviado ao Congresso…
Supondo que o PL (projeto de lei) fosse magicamente aprovado hoje, os agentes saberiam quando aconteceria cada evento – isso está explicado lá. Nós colocamos no texto as datas que achamos adequadas. Isso é importante: o projeto estipula datas para que o Brasil tome as decisões importantes.

Essa formação de preços pelos agentes seria totalmente livre, não teria nenhum tipo de controle?
Existem sim preocupações na formação de preços por oferta. Temos de garantir que nenhum agente possa controlar os preços, e criação de um órgão de monitoramento de mercado seria ideal para isso, para coibir práticas anticompetitivas. Esse órgão tem que ser estudado. Ele pode ser independente, que é como a gente gostaria. Seria como um Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). E, no limite, seria até a função do regulador, como é em muitos países.

Os leilões para energia nova (A-6, A-4) continuam como são?
Os leilões dão a garantia de receita aos geradores para ter financiamento. É por isso que os leilões dão contratos de longo prazo. Esse processo tem que continuar para garantir que a energia nova tenha recursos. Mas hoje o gerador vende dois produtos dentro do mesmo leilão – que é a energia e o lastro para gerar essa energia. A gente vai separar esses produtos.

Como será feita essa separação?
Será um leilão de lastro e outro de energia, tudo no longo prazo. A receita de lastro mais a de energia serão suficientes para remunerar o capital total e pagar o financiamento. Mas há um detalhe: pagarão pelo lastro todos os consumidores, tanto do mercado regulado como do livre.

O que é exatamente “lastro” neste novo modelo?
Lastro é a garantia física do projeto; o lastro garante que o projeto seja construído. Mas se ele for construído e não produzir nenhuma energia, ficar parado? Então ele não produziu energia, apesar de existir a usina. Então você concorda que a energia é um produto diferente do lastro?

Por que todos os consumidores pagarão pelo lastro?
A garantia da construção é algo que tem que ser pago por todo o mercado. Porque a energia desse projeto pode atender ao mercado regulado ou o livre. Mas se um projeto não consegue se remunerar só com a receita de lastro, mais a venda de energia através de contratos, ou mesmo no mercado spot, aí ele vai poder participar de leilões de contrato de energia pura, no espírito dos leilões A-3, A-5 que temos hoje.

Como será precificado o lastro?
Vai ser feito um decreto como vai ser calculado.

Esse projeto prevê a ampliação do mercado livre. Isso pode acabar prejudicando o mercado regulado? As distribuidoras perderão mercado?
O texto do projeto diz que quando o consumidor sai da distribuidora, a empresa tem uma série de mecanismos para vender seus excedentes, por exemplo os leilões de excedentes, os próprios MCSD (Mecanismo de Compensação de Sobras e Deficit). E, depois, se a distribuidora ficar com uma sobra, uma exposição residual, esse custo é rateado por todos os consumidores do sistema, o que é correto. Todo mundo está pagando o custo dessa transição, o custo dos contratos legados para o mercado mais competitivo.

Como ficam as fontes alternativas no novo modelo?
Propusemos realização de um estudo para criar um mercado de certificado de energia limpa. Todas as outorgas emitidas até 2020, de energia incentivada, vão continuar com desconto na Tusd (tarifa de uso da rede de distribuição). Mas, para as novas outorgas, que começariam sem esse desconto na Tusd, esses projetos teriam um prêmio financeiro pelo fato de que produzem energia limpa. Esse prêmio seria gerado pela comercialização de um certificado de energia limpa para cada megawatt hora produzido. Seria criada a obrigação de compra pelo consumidor desses certificados, associadas às metas de descarbonização do país. Aí vai ter uma competição entre esses certificados para atender a essa cota. E o mercado vai dar o preço desses certificados. Aí gera uma renda adicional que esses projetos (PCHs, biomassa, éolica e solar) vão ter.

No pior dos cenários, se o Congresso travar, não aprovar tudo o que foi planejado: novo modelo, privatização da Eletrobras… como fica?
Se tudo desabar, não passar nada, paciência. Teremos ao menos criado uma agenda de unanimidade e convergência no setor para os próximos governos. Essa é uma escolha do país, a gente está fazendo o que pode, mas na vida tem o que você controla e o que você não controla. A gente tem que fazer a nossa parte.

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