Ministério e ANTT mudaram local e reduziram obras na Malha Paulista, aponta Seinfra do TCU

Dimmi Amora, da Agência iNFRA

O pedido de interrupção da assinatura do contrato de renovação antecipada da Rumo Malha Paulista, feito pela SeinfraPortoFerrovia do TCU (Tribunal de Contas da União) na última segunda-feira (13), aponta que o governo e a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) fizeram mudanças na versão final do contrato que alteram significativamente a proposta aprovada pelo tribunal em dezembro do ano passado.

Entre as mudanças, a agência alterou as cidades que teriam obras de redução de conflitos urbanos, retirando umas e incluindo outras; reduziu a necessidade de investimentos da concessionária em expansão da malha; e não cumpriu parte das determinações do órgão de alterações na proposta original que tinha inconsistências.

Apesar do ministro relator do caso, Augusto Nardes, não ter tomado decisão de suspender cautelarmente a assinatura, como haviam pedidos os técnicos, a ANTT preventivamente retirou o processo de pauta na terça-feira (14) e iniciou reuniões com os técnicos do órgão de controle. Não há, no entanto, nova previsão para a assinatura do contrato, que ocorreria na sexta-feira (17).

Em resposta à Agência iNFRA, o Ministério da Infraestrutura informou que “já está em diálogo com o corpo técnico do TCU, esclarecendo eventuais dúvidas e questionamentos. O Governo Federal entende que a condução do processo foi feito de forma técnica, célere e em acordo às determinações apresentadas e que não há qualquer descumprimento ao Acórdão firmado com o tribunal”. A ANTT informou que ainda analisa as informações do relatório da Seinfra.

Vantajosidade questionada
O documento da Seinfra, ao qual a Agência iNFRA teve acesso, aponta que houve alterações ou descumprimentos de itens do acórdão do TCU de dezembro de 2019 em três pontos: a contabilização dos ativos da ferrovia, a duplicidade de contabilização de gastos com manutenção e alterações na proposta em relação à quantidade e localização dos investimentos.

A contabilização dos ativos é uma questão que incomoda os técnicos desde o início do processo. A Seinfra propôs que o contrato só fosse assinado após haver uma contabilização dos ativos da ferrovia, separando o que deve ser indenizado à Rumo e o que não deve (porque não tem relação com a operação).

A ANTT argumentou na época que demoraria pelo menos 18 meses para fazer e isso poderia levar à redução da vantajosidade da renovação, com prejuízos para o país com a demora. A proposta que passou foi que a contabilização dos ativos poderia ser feita em até 18 meses, separando os ativos indenizáveis e não indenizáveis e deixando claro que haveria reequilíbrio do contrato após conhecido o valor real.

Para os técnicos do TCU, uma mudança na redação do contrato em relação ao que foi analisado pelo órgão não só permite que todos os ativos sejam indenizados como não deixa claro que haverá reequilíbrio após o valor real ser conhecido, o que poderia levar a prejuízo ao erário.

Manutenção
O segundo ponto decorreu do não atendimento de forma total a uma inconsistência apontada pelos técnicos e que a ANTT havia se comprometido em mudar. Na análise dos estudos, o TCU apontou que cerca de R$ 2,2 bilhões de gastos da Rumo estavam contabilizados duas vezes, como investimentos e como manutenção.

O TCU pediu para que isso fosse contabilizado só uma vez. Mas, segundo a Seinfra, a ANTT deixou de fazer isso para uma parte do período do contrato, até 2030, o que daria cerca de R$ 350 milhões em custos duplicados.

Mudança de cidades
A mudança mais complexa, no entanto, é em relação aos investimentos previstos, o que fez com que a Seinfra passasse a avaliar se realmente há “vantajosidade” em renovar o contrato antecipadamente. O critério de vantajosidade é essencial para que o órgão de controle considere legal a renovação.

No caso da Rumo Malha Paulista, os itens essenciais que fizeram com que esse critério fosse atingido – na análise feita pela própria ANTT – foi a realização de obras que ampliariam a capacidade da ferrovia e reduziriam os conflitos urbanos em dezenas de cidades de São Paulo.

Os técnicos da Seinfra apontaram no entanto que, após a aprovação dos estudos pelo TCU, o que ocorreu mais de dois anos depois da audiência pública, a ANTT rodou novos estudos e informou que “após análise com o auxílio do software Rail Traffic Controller, teriam sido constatadas discrepâncias significativas” em variáveis ao se usar um trem-tipo de 120 vagões (o atual é de 80).

Uma das mudanças do estudo diz que só haveria um ganho de 10% e não de 220% como no estudo anterior, no tempo de percurso das composições antes das obras.

Segundo o TCU, com a mudança, “os investimentos em capacidade foram substancialmente impactados, tanto os ‘com prazo determinado’ quanto os ‘condicionados à demanda'”. Ou seja, com isso, a concessionária terá que gastar menos com obras e terá que fazer um pagamento maior em dinheiro ao governo.

Sem motivação
Os técnicos ainda apontaram outro impacto no projeto, dessa vez por uma mudança determinada pelo Ministério da Infraestrutura, mas que, segundo eles, não teve a motivação informada pela agência reguladora. Segundo eles, a previsão inicial era que haveria no mínimo R$ 2,2 bilhões em obras de redução de conflitos urbanos, na versão original do estudo.

Esse recurso seria decorrente da outorga a ser paga pela concessionária e poderia até ser aumentado se houvesse necessidade de mais obras.

No entanto, com os novos parâmetros, esse valor caiu para R$ 673 milhões na versão enviada ao TCU e que seria assinada pela agência. Houve ainda troca de cidades e mudanças nas prioridades. Diz o relatório:

“No que tange à ordem de priorização dos municípios, deve-se registrar que deixaram de ser atendidas as cidades de Sumaré, Hortolândia, Uchoa, Americana, Cordeirópolis, Matão e Santa Fé do Sul. Ademais, foram incluídos os municípios de Valinhos, Bauru, Dois Córregos, Jaú, Bálsamo, Pederneiras, Fernandópolis e Barretos (peça 325, p. 40-42). Ante a alteração, impende-se que sejam verificadas, com maior detalhamento, as justificativas para a mudança da relação de priorização”, pede o relatório.

Segundo a unidade técnica, com as mudanças realizadas após a análise, o valor da outorga a ser paga passou a R$ 2,86 bilhões, o que significa que ela seria 43% superior aos investimentos obrigatórios na malha (aumento de capacidade e solução de conflito).

“(…) A vantajosidade da prorrogação antecipada da Malha Paulista anteriormente apresentada mostra-se agora reduzida de forma relevante. Tais alterações justificam análise mais aprofundada a respeito da sustentação dos fundamentos anteriormente apresentados e que viabilizam juridicamente a prorrogação antecipada do contrato de concessão da Malha Paulista”, informa o documento, disponível neste link, ao pedir a suspensão liminar da assinatura.

Governo diz que vantajosidade aumentou com mudanças
O Ministério da Infraestrutura defendeu que as mudanças feitas após a aprovação pelo TCU (Tribunal de Contas da União) na proposta de renovação antecipada do contrato da Rumo Malha Paulista aumentaram a “vantajosidade” do projeto.

Ainda na noite de quarta-feira (15), uma reunião entre técnicos do TCU e do governo, iniciou o processo para tentar um acordo em relação aos apontamentos da secretaria técnica do órgão de controle. Novos encontros ficaram acertados enquanto o governo prepara explicações sobre a mudança. A íntegra da posição do Ministério da Infraestrutura sobre o tema segue abaixo:

“A respeito do processo de prorrogação antecipada do contrato de concessão da Rumo Malha Paulista protocolado no Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério da Infraestrutura esclarece que não há indícios de irregularidades nos documentos apontados no Relatório de Acompanhamento da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Portuária e Ferroviária (SeinfraPortoFerrovia). Nas exposições apresentadas ao órgão na última quarta-feira (15), com representantes da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), o Ministério informou que os ajustes realizados na minuta contratual não comprometem o atendimento das recomendações e determinações do órgão, mas, sim, visam dar clareza e segurança jurídica às partes envolvidas, além de buscar ainda mais atender ao interesse público.

Na reunião, o Ministério também informou que, como reflexo do amadurecimento da discussão sobre a priorização de municípios a serem atendidos com obras para resolução de conflitos urbanos, será possível atender 40 municípios (com cerca de 5,4 milhões de pessoas): os 31 inicialmente previstos, além de outros 9, afastando a hipótese de que parte dos municípios deixariam de ser atendidos.

Sobre os valores de investimentos, a previsão inicial era de que haveria, no mínimo R$ 2,2 bilhões, para a realização de intervenções nos 31 municípios, conforme proposta da audiência pública. No entanto, com a revisão dos estudos Pós-Acórdão, a estimativa considerou o investimento de R$ 1,014 bilhão para intervenções em 33 municípios, já considerando os percentuais de redução por conta do Regime Especial de Incentivos para o desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI), bem como fatores de redução por nível de maturidade dos projetos.

Por último, em relação à alegada perda da condição de vantajosidade da prorrogação antecipada da Malha Paulista, o Ministério esclarece ainda que, ao contrário dos apontamentos da SeinfraPortoFerrovia, o processo se tornou ainda mais vantajoso, na medida que será possível executar mais obras para solução de conflitos urbanos,  garantindo o aumento da capacidade de transporte da ferrovia com custos mais baixos e uma adequada prestação do serviço, resultando em um saldo remanescente do valor de outorga, cujos valores excedentes serão destinados aos cofres da União”.

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