EDUARDO SANOVICZ,
PRESIDENTE DA ABEAR
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS AÉREAS)

Sanovicz: Se a Raynair fosse uma doméstica voando no Brasil, custaria 27% mais cara

O presidente da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), Eduardo Sanovicz, mantém uma inabalável confiança de que o preço das passagens aéreas no país está em queda, após a mudança na regulamentação que permitiu a cobrança por bagagem despachada. “Afirmo com todas as letras que os primeiros dados nos autorizam a dizer que há tendência, sinalização, que aponta para uma queda”, afirmou Sanovicz em entrevista à Agência iNFRA.
À frente da associação que reúne as maiores companhias aérea do país, ele explica que os dados que indicam aumento de preço nos últimos meses, obtidos em pesquisas utilizadas para medir a inflação, não são a fórmula adequada para avaliar se o valor pago pelas passagens está se alterando. Afirmou ainda que os dados com o preço de venda já mostram a tendência de redução.
Para que os preços continuem caindo, no entanto, o presidente da Abear afirma que serão necessárias mudanças mais profundas nas regras da aviação do país. Entre elas, a que altera as regras de cobrança do ICMS para voos nacionais, para adequar a legislação do Brasil à do resto do mundo, tornando a aviação mais competitiva.
“Se a Raynair, que é a empresa mais eficaz do mundo, fosse uma doméstica voando Rio, Fortaleza, Brasília, BH, ela custaria 27% mais caro”, disse o presidente da associação.

Por que a associação está tão convicta de que as passagens já começaram a cair após a mudança regulatória das regras de direito dos passageiros?
Existem três formas correntes no Brasil pela qual se apresenta ao público a variação de preços de bilhetes aéreos. Um é a estrutura do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Ele elege um número de rotas nos sites das empresas aéreas e, mês a mês, acompanha o preço do site. Faz uma amostra e tem uma história metodológica. Eles não estão errados. É uma opção metodológica que cria uma história sequencial. Mas tem um objetivo que é comparar o mês A, com o anterior. Porque o IBGE se presta a medir a inflação mensal no país. É o trabalho dele. É aí que constrói a referência. E a FGV calcula de maneira muito parecida, também com amostragem.

E o que vocês fazem?
A ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) utiliza-se de metodologia reconhecida internacionalmente para calcular preço de passagem aérea. A diferença é que não se utiliza amostra. O que vai para a ANAC é uma espécie de mega pen-drive, todos os meses, um de cada empresa, com a informação dos preços reais praticados, vendidos, em todos os voos. Enquanto os outros fazem uma amostra e compara um mês com outros. E quando se olha no site, todos sabem, se comprar cinco horas ou três dias depois, ele pode ter baixado ou subido. O que está no site não é o que se praticou, para o bem e para o mal, para cima e para baixo. O outro é preço vendido. Um paga R$ 329, outro R$ 110 e outro R$ 1.200.

E os dados de vocês são esses?
Apresentamos os dados sob esse ponto de vista, dessa prática. Afirmamos e reafirmamos, ponho minha mão no fogo aqui, que as três empresas cujos dados apresentamos, porque começaram a cobrar pela bagagem, apresentaram preços mais acessíveis que no ano passado. Diversas variáveis compõem o preço da passagem como combustível, tributo, câmbio. Se olhar esses preços nos últimos três meses, eles estão estáveis. O que não está, subiu um pouquinho, como combustível. E, com essa metodologia, também fomos olhar outras coisas. A ANAC divulgou que no primeiro semestre os preços caíram 2,56%, no critério técnico, internacional. O IBGE soltou que o IPCA-15 caiu 12,99% de janeiro até setembro. Se até junho caiu 2,5 na ANAC, e até setembro quase 13 no IBGE, temos que olhar. E nunca olhamos a variação de um mês para o outro.

Por quê?
Em julho, você tem férias, e agosto não tem. Não dá para comparar julho com agosto. Os preços de julho, em geral, são mais altos. Em setembro, podemos ter três feriados e, em outubro, um. Isso impacta. Comparar um mês com outro é comparar banana com laranja. Por isso, tecnicamente, comparamos agosto com agosto ou séries de ano, semestre. Houve uma diferença de 10 pontos naquela comparação do IBGE com a ANAC. Concluímos que, se os preços estavam estáveis e se a ANAC e o IBGE haviam mostrado quedas, 10 pontos de gap era muita coisa.

E o que era?
A demanda de agosto de 2017 subiu 5,5% comparada a agosto de 16. Ora, demanda é passageiro a bordo. Se o custo está estável, a ANAC e o IBGE falam que caíram, o que pode ter variado? A novidade é a tarifa sem bagagem. Ligamos para as empresas que nos informaram que tinham dados preliminares, porque era cedo para tirar uma avaliação conclusiva, mas os preliminares eu queria. Não precisava fazer o cálculo de todas as rotas. Fizemos uma seleção de rotas de alta, média e baixa demanda para termos uma preliminar, mas no critério ANAC. Todas mandaram mostrando queda. Por isso, afirmo com todas as letras que, os primeiros dados nos autorizam a dizer que há tendência, sinalização, que apontam para uma queda.

Nessas mudanças regulatórias e legislativas que o governo faz, sempre se coloca a redução dos preços como uma meta, um objetivo. Fazer isso num mercado com tarifas livres não é um risco elevado de depois ficar sem discurso?
Depende. Quando as mudanças vão no sentido de aproximar nosso ambiente regulatório do ambiente internacional, o que a história mostra é que elas sempre acabam gerando preços mais acessíveis. Porque tudo o que tem no ambiente regulatório brasileiro diferente do internacional encarece a passagem. Te dou dois exemplos: o ICMS e a tarifa de conexão. O risco se dá, porque o câmbio de fato pode influir. Mas se pegar a experiência que temos no Brasil, de relevância, que é a liberdade tarifária de 2002 para cá, os preços caíram pela metade. Mas, se for em 2003 e 2004, no começo, teve ano que subiu um bocadinho. Mas, quando começou a cair, se instalou um ambiente competitivo de fato, a velocidade de queda é absurdamente alta.

Temos um mercado com quatro empresas grandes, algumas pequenas e um número de viagens pequeno em relação à quantidade de viagens por pessoa, comparado a outros mercados mais maduros. O quanto isso também dificulta uma maior passagem dos ganhos ao consumidor?
O Brasil é o quarto maior mercado doméstico do mundo. Não é irrelevante. Acima temos o norte-americano, que é sete vezes o nosso, o Chinês que dá duas vezes e meia maior, e o japonês que é ligeiramente igual ao nosso que tem 100 milhões de passageiros ano. Ter quatro empresas competindo também é importante definir. Há um gráfico de referência internacional (HHI) que compara graus de concentração e competitividade em qualquer mercado. Ele coloca o Brasil como um dos 10 mercados mais competitivos do mundo na aviação. Mas é possível ampliar isso? Sim. Mas estamos falando de política econômica de desenvolvimento, do país andar para frente, e um processo de ampliação de renda. Com a capacidade de demanda que o país tem, hoje, me parece que é possível atender, sem entrar num programa de discussão de subsídio, verba pública, como outros modais eventualmente o fazem. Outra coisa importante é lembrar que, até 10 anos atrás, girávamos entre uma e duas empresas com relevância. Varig e Vasp, Varig e Transbrasil. De 2007 para cá são quatro empresas brigando. É o dobro de lá para trás, além do mercado de 100 milhões.

Mas sempre se colocou que essa ampliação de mercado também dependia da ampliação da infraestrutura, principalmente a regional. Não vimos isso andar nos últimos 6 anos…
São 10 anos ou mais.

E dá para crescer sem que isso ocorra?
É possível alguns avanços com ajustes na infraestrutura, na malha, eventualmente um investimento privado em aviões que hoje não estão aqui. Mas não numa escala que cubra todas as demandas que o país tem por conectividade regional em cidades de menor porte. Para que isso aconteça, faltam duas coisas. A inclusão por emprego e renda e a entrada no ar de PDAR (Programa de Desenvolvimento da Aviação Regional) que, até onde sei, está nos seus últimos detalhes na estrutura da SAC (Secretaria de Aviação Civil). Estamos ansiosos por vê-lo no ar.

E mudou algo em relação ao que se tinha?
Teve um da Dilma, lá de trás. Fizeram uma revisão disso e te digo honestamente que, dessa vez, foi feito com muito debate conosco. Não foi como no primeiro que passamos batido. Demos sugestões, mas não vimos a versão final ainda.

Ainda na parte de infraestrutura, queria que o senhor falasse sobre a preocupação das empresas em relação ao aumento do número de concessões de aeroportos, já que sempre houve crítica ao modelo de pagamento de outorga, e que agora está sendo ampliado.
Nossa posição é histórica e pública. Defendemos, ainda em 2012, que as concessões fossem por menor tarifa e não por maior outorga. Mas a proposta vencedora foi outra, e nos cabe trabalhar da melhor forma possível dentro desse cenário. O que vivemos no primeiro pacote de concessões tem dados positivos do ponto de vista de resultado. A experiência de voo nos aeroportos que já estão entregando um nível novo de serviço é positiva para usuários e para as empresas aéreas, que são os clientes. Brasília e Guarulhos estão de destacando. Galeão está logo atrás, e depois, Confins. Natal e Viracopos estão se ajustado. O dado negativo é que não houve um instrumento de controle eficaz, e houve processo de aumento de custos muito grande em certos itens. Entregamos à ANAC dois anos atrás estudo muito detalhado, contratado externamente, que tivemos tarifas que cresceram mais de dois mil por cento depois das concessões. Os concessionários ficaram muito à vontade para fazer alguns ajustes. Nessa segunda leva, o processo foi corrigido, praticamente. A partir de agora, quem ganha as concessões, quem fizer reajustes fora de uma certa curva lógica de preços, vai ter que apresentar justificativas a um conselho de usuários. Agora é uma expectativa de ganhos ainda maiores. O modelo de negócio dos concessionários, o modelo como atende demandas, sintonizadas com a agilidade e a rapidez da nossa atividade, é muito interessante. Temos avaliações bastante positivas e expectativas iguais.

Por que é justo que num momento de crise econômica como o atual se fazer redução de alíquota de imposto para o setor, como defende a Abear em relação ao ICMS do combustível de aviação?
Primeiro porque retoma o que já respondi na primeira pergunta. Tudo no Brasil que está no ambiente regulatório das regras da aviação que difere do modelo internacional acaba gerando um custo para a aviação brasileira que não existe no exterior e acaba tornando, no fim do dia, um bilhete um pouco maior que o do exterior. No planeta inteiro não existe tributo regional sob querosene de aviação. O único é o Brasil, a partir da Constituição de 1988, quando os estados foram autorizados a cobrar de forma autônoma. Cada estado passou a fixar uma alíquota ao produto que quis. Lá no fim dos anos 1980, a aviação transportando 20 milhões de passageiros ano, com tarifa média por volta dos R$ 800, era um troço de luxo, de rico, colocaram a alíquota no teto. Praticamente os estados todos puseram em 25% a alíquota. Mas como o Brasil é signatário de acordos internacionais, o que não se cobra de um voo quando vem do exterior, não se pode cobrar quando vai. Se encostam dois aviões da mesma empresa em Guarulhos, abastecidos na mesma bomba, o que vai para Fortaleza paga 25% de ICMS. O que vai para Buenos Aires, cuja distância é semelhante, paga zero. Quando bater em Buenos Aires, não paga um tributo regional. Lá, eles pagam os tributos nacionais. Mas quando chega em Fortaleza, ele paga. A moral da história, só em combustível essa diferença vai a uns 15%, o que torna mais caro o voo de Fortaleza do que o de Buenos Aires. Essa política faz com que seja mais caro fortalecer o turismo e a economia do Nordeste do que mandar gente para Buenos Aires ou Miami.

E o que vocês fizeram?
Extinguir seria inexequível. Aderimos ao projeto que cria um teto de 12%, que é o teto já praticado por 18 estados brasileiros, alias 21, que têm política para cobrar menos de 12%. No Ceará, é 18%, mas tem várias regras que reduzem. O número vai de 0 a 25%, sendo que 21 estão de 12% para baixo.

A diferença também é ruim?
É. Mas ela vai continuar. Mas vindo para 12%, nós colocaremos 198 novos voos porque eles voltam a ser viáveis.

O que ainda preciso fazer para que o crescimento desses últimos dois meses se mantenha e voltemos ao patamar de elevação visto até 2015?
Aí é assim: a nova regra de bagagem ajudou, o ICMS ajuda, rever tarifa de conexão ajuda, porque o Brasil fez isso de jeito torto, porque no mundo inteiro só paga tarifa de conexão quem usa. Aqui, ela foi jogada para dentro do preço do bilhete e é socializada. Queremos mudar a regra para sair do preço do bilhete para ser paga por quem usa. E temos que enfrentar a mãe de todas as batalhas que é o preço do querosene de aviação em si. Entender onde está a distorção para que a gente consiga ter um preço competitivo. Não é possível que a gente tenha um país produtor de petróleo com o combustível em Manaus sendo 50% mais caro que em Miami. Isso não faz sentido. Mas é um ponto mais para frente na nossa agenda.

Mas, na média, nossos impostos, custos, todos são muito maiores que o resto do mundo paga?
O último estudo que fizemos mostra que se a empresa mais eficaz em gerenciamento de custos no estrangeiro operasse no Brasil, por um passe de mágica, ela custaria 27% mais caro, por causa do modelo de tributos e custos do Brasil, regulatório, de infraestrutura. Se a Raynair, que é a mais eficaz, fosse uma doméstica voando Rio, Fortaleza, Brasília, BH, ela custaria 27% mais caro.

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