Análise: Sinal amarelo em comercializadores impõe reflexão sobre garantias

Roberto Rockmann, colunista da Agência iNFRA*

As primeiras notificações de duas comercializadoras que dificilmente conseguirão honrar contratos com suas contrapartes nesses últimos dias acenderam um sinal amarelo no mercado. Apontam para a necessidade de aperfeiçoamento das regras de segurança de mercado, um tema que ganhou força no início de 2019 depois da quebra das empresas Vega e Linkx, mas ainda se arrasta em discussões entre CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e resistência de comercializadoras.

Só na segunda semana de agosto, quando a liquidação das operações for efetuada pela câmara, será possível saber se os casos se confirmarão em inadimplência e qual será seu tamanho. Até lá, muitos rumores ganharão corpo.

O forte crescimento do mercado livre desde 2015 fez muitas comercializadoras abrirem portas. Hoje, apenas se exige o capital social de R$ 1 milhão para fazer parte da CCEE, sendo que alguns empreendedores abrem comercializadoras sem ter nenhum conhecimento do setor elétrico. Não se exige depósito prévio de margem, nem que seja de percentual. Isso estimula que os riscos se multipliquem.

No mercado brasileiro, os agentes no mercado livre e, principalmente, as empresas de comercialização, tomam o risco de crédito dos outros agentes. Não são apenas corretores. À medida que o mercado livre aumenta, também há um aumento no número de intermediadores.

Ou seja, o número de elos na corrente que podem se romper e contaminar os seguintes está ficando maior; e a corrente está ficando mais longa. Isso coincide com novos mecanismos, como derivativos e a potencial abertura do mercado livre de gás natural.

Esse cenário impõe a urgência de novas regras de aperfeiçoamento do mercado. A CCEE tem lançado o debate há dois anos, com sugestões públicas sobre o tema, mas não se avançou. Chegou-se a propor um mecanismo com origem no mercado financeiro utilizado para reduzir riscos de calote e exposição do mercado: a “chamada de margem”.

As comercializadoras chiaram. Defenderam a autorregulação. O assunto foi deixado para a ANEEL. A pandemia alterou a agenda. Agora o assunto voltará à mesa em uma consulta pública. Cabe relembrar que o mercado livre no Brasil nasceu no fim dos anos 1990, quando surgiu o Mercado Atacadista de Energia. Ali os agentes também buscaram criar as próprias regras. Não deu certo. Poucos meses antes do racionamento, a ANEEL interveio.

Quando o mercado foi pensado, no fim dos anos 1990, planejava-se um mercado de negociação de diferenças milionárias entre agentes, que estariam em grande parte contratados e cujos volumes negociados seriam baixos. Hoje o mercado livre responde por um terço da carga do país e se negociam bilhões por mês, ou seja, exigindo um novo sistema de garantias.

Vão esperar novas crises financeiras ou serão criadas novas regras?

*Roberto Rockmann é escritor e jornalista. Coautor do livro “Curto-Circuito, quando o Brasil quase ficou às escuras” e produtor do podcast quinzenal “Giro Energia” sobre o setor elétrico. Organizou em 2018 o livro de 20 anos do mercado livre de energia elétrica, editado pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), além de vários outros livros e trabalhos premiados.
As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

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